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Anfavea: recuperação da indústria automotiva ainda é tímida
Por Helder Lima
Editor de Economia
05/06/2004 | 22:19
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Os dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) projetam para este ano um crescimento de vendas no mercado interno ao redor de 8%, perspectiva que foi reforçada pelos números de maio divulgados na última sexta-feira, com expansão de 6,6% sobre abril e de 7,9% de janeiro a abril em relação ao mesmo período do ano passado. A projeção alimenta a expectativa de a indústria automotiva do país cravar o segundo melhor ano de sua história, com um total de 1,94 milhão de unidades. Mas essa possibilidade não alavanca o otimismo do presidente da Anfavea, Rogelio Golfarb, para quem a recuperação do mercado interno continua tímida. Nesta entrevista exclusiva ao Diário, Golfarb analisa a situação da indústria sob a necessidade de ganhar escala, desafio que tira o sono dos executivos. Afinal, maior escala significa abertura de mercados. Golfarb também fala em uma nova mentalidade de negociação com o governo para que se alcance um entendimento perene.

Diário – Nós devemos ter este ano em termos de vendas e produção um crescimento ao redor de 8%. Esse índice é porcentualmente expressivo mas, como o senhor tem defendido, ainda não resgata o mercado interno. Mas, afinal, o que significa esse crescimento para a indústria em termos de futuro?
Rogelio Golfarb – Esse crescimento de 7,9% do mercado doméstico expressa uma comparação com o ano passado na qual tivemos um mercado interno de 1,42 milhão de unidades. Portanto, nós saímos de uma base pequena, uma base baixa, um ano muito ruim. No ano passado nós tínhamos a Selic a 26,5%. Está certo que o câmbio agora subiu, mas naquela época estava em R$ 3,40. É um crescimento pequeno para a estrutura de uma indústria que tem 43% de capacidade ociosa.

Diário – De qualquer forma, pensando no todo da indústria, segundo a previsão da Anfavea para este ano, haverá um número expressivo no total e 2004 deverá ser historicamente o segundo melhor ano da indústria...
Golfarb – É, porém, precisamos olhar isso com uma perspectiva um pouco diferente. Nós estamos falando que vamos vender este ano por volta de 1,94 milhão de unidades no total. Em 1997, nós chegamos a 2 milhões, mas em 97 nós tínhamos menos montadoras, nós utilizávamos praticamente toda a capacidade; de lá para cá muita coisa mudou. Hoje, as tecnologias estão mais caras e o número de produtos que oferecemos no mercado é maior.

Diário – Existe a perspectiva de redução tributária para a indústria em um acordo permanente com o governo, como se tem falado?
Golfarb – Nossa visão é que chegou o momento de uma ação de crescimento de mercado sustentado e não emergencial. Precisamos de um mecanismo que dê à indústria automobilística auto-suficiência e que permita justificar a aprovação de investimentos; é isso que mantém a indústria atualizada e competitiva.

Diário – Qual o âmbito dos investimentos hoje na indústria?
Golfarb – Temos investimentos e você vê isso pelo número de lançamentos de produtos que temos no mercado. Mas precisamos de um patamar mais alto do que o atual para manter a modernidade da indústria e o nível de inovação. Não é a questão de ter ou não ter investimento. A questão é ter mais e mais escala para manter o nível de atualização que nós temos. As nossas fábricas são modernas, mas não continuarão modernas para sempre. Ainda hoje temos carros bastante competitivos, mas com esses níveis de investimentos podemos sofrer uma desatualização do produto.

Diário – Em quanto tempo os produtos perderão atualidade?
Golfarb – É difícil definir porque isso depende de uma montadora para outra. Eu diria que não dá para esperar três ou quatro anos. Temos de trabalhar rapidamente.

Diário – Como é que está o uso da capacidade instalada da indústria neste momento?
Golfarb – A radiografia da indústria hoje é a seguinte: de 100% da capacidade instalada, 41% são dedicados ao mercado doméstico, 16% às exportações e 43% são ociosidade. Você tem uma equação de capacidade na qual o dedicado ao mercado doméstico é menor do que a capacidade total ociosa.

Diário – Mas nos últimos anos não houve uma aposta exagerada no potencial do mercado brasileiro? A indústria não foi além da conta em suas previsões?
Golfarb – Existem várias correntes nessa análise. Eu diria que não, porque nós tivemos de 1992 até 1997 um passo de crescimento alto por um período longo, praticamente cinco anos. Crescemos ano após ano numa cadência considerável. E isso foi o que serviu como endosso ao aval para esses investimentos. E lembre-se que em 1994 nós tivemos o Plano Real e tivemos aí a estabilidade econômica, o fim da inflação galopante, que foi um plano que depois de muitos anos deu certo. As expectativas eram de longo prazo. O que não se esperava, e que surpreendeu, foi não haver crescimento a partir de 1997 até hoje.

Diário – O senhor acredita que o bicombustível irá chegar a 100% de produção de carros no país?
Golfarb – Eu não sei se vai chegar a 100%. Eu acho que o bicombustível é um produto que tem muito a ver com a vocação brasileira de ter combustíveis alternativos e ninguém teve no mundo uma experiência do tamanho do Brasil com combustível reno- vável. Mas eu acredito que a tendência de crescer existe.

Diário – Há um patamar projetado para ele?
Golfarb – Nós não temos. A Anfavea não possui um patamar projetado para ele. O que nós temos notado é um crescimento, até porque está havendo uma substituição na linha de produção de motores que eram só gasolina por motores bicombustíveis. Não sabemos exatamente até onde isso vai chegar.

Diário – O emprego vem crescendo junto com o movimento da indústria em uma proporção menor. Por quê?
Golfarb – O que acontece é o seguinte: o crescimento do emprego vem em paralelo com o próprio crescimento do Produto Interno Bruto. O PIB cresceu primeiramente no setor de exportação e no agrobusiness e isso atinge uma certa gama de produtos nossos, mas não todos os produtos.




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