Setecidades Titulo Mauá
Deslizamento preocupa
menos que infraestrutura

Levantamento aponta a viela Caminho do Sol, no Jardim Zaíra,
como área de risco de deslizamento mais crítica da Grande SP

Por Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
22/07/2012 | 07:00
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Na viela Caminho do Sol, em Mauá, apontada como área de risco de deslizamento mais crítica da Região Metropolitana de São Paulo pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), os moradores não estão preocupados com deslizamentos. Eles reclamam é da falta de infraestrutura. Apesar de viver em barrancos instáveis, as reclamações são sobre inexistência de asfalto, buracos e cobrança de iluminação pública e esgoto mesmo sem o oferecimento desses serviços. 

A viela fica encravada na região do Chafic, no Jardim Zaíra, que tem 11 dos 103 setores de risco da cidade. Esse é o lar do aposentado Moisés Braz de Oliveira, 65 anos, 23 deles vivendo no alto do morro. Oliveira já viu o muro de um vizinho ser arrastado num deslizamento, mas fora isso, diz que gosta de viver ali. Criou duas filhas num barraco de madeira e hoje mora com a esposa e a menina mais nova na casa de alvenaria que ele mesmo ergueu. 

Mas e o medo de viver numa área tão perigosa? Para Oliveira, não existe. "Aqui o que tem é união dos moradores, porque se depender dos políticos, nada acontece." 

Recentemente, os vizinhos fizeram ‘vaquinha' para construir muro improvisado no barranco que sempre desliza. Jogaram até um pouco de cimento por cima da terra para ver se segura. "Vamos nos virando, porque sair daqui é difícil. O custo de vida está alto", afirma o pedreiro Valter Ribeiro da Rocha, 46, enquanto ergue o terceiro andar de sua casa. Aliás, a cena mais comum na Caminho do Sol são quintais cheios de tijolo e cimento. Barraco é difícil de achar. 

A recém-chegada Tamiris da Silva, 17, ocupou casa ao lado de barranco que deslizou diversas vezes e, inclusive, teve imóveis vizinhos - de alvenaria - interditados pela Defesa Civil. "Não tenho medo. Conheço esse lugar desde que era menina e nunca fiquei sabendo de morte aqui." Tamiris resume o sentimento da maioria dos vizinhos: sem tragédia, não há medo. E assim as pessoas continuam ali.

Áreas de risco estão espalhadas pela cidade

O motorista Josuel José dos Santos, 49 anos, viu a morte de perto ao tentar salvar uma vizinha soterrada. O azulejista Jorge Luís de Sales, 30, observou pela janela as casas de seus vizinhos serem arrastadas por avalanche de terra. A dona de casa Eunice Maria da Silva, 48, tem medo que a residência construída no alto do barranco caia sobre a sua. Em comum, os três vivem em um dos 103 setores de risco mapeados pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) em Mauá.

Santos e a mulher, Maria Aparecida, 55, moram há 16 anos na Rua Anne Automar, no Jardim Zaíra. Ali há CEP e a via aparece no GPS. Mas falta segurança para as oito pessoas que vivem com o casal. "Perdi as contas de quantas vezes saímos correndo daqui. A cada chuva, é um desespero", reclama Cida. 

O marido tem esperanças de melhorar a vida no lugar que aprendeu a chamar de lar, mesmo depois de ter presenciado a morte de perto quando, há cinco anos, tentou salvar uma vizinha cujo barraco desceu morro abaixo. "Peguei na mão e a puxei para fora da terra, mas ela já estava morta", relembra.

A família não quer sair dali. O que desejam é solução para o risco, que técnicos do IPT acreditam existir. A cidade precisa de cerca de R$ 90 milhões para tornar as áreas críticas menos perigosas para os moradores, fora o dinheiro necessário para a urbanização. "O mapeamento é o primeiro passo, pois é exigência do Ministério das Cidades para concessão de verbas", diz o geólogo do IPT Eduardo Soares de Macedo.

Vizinho de Josuel, Sales mora no barranco logo abaixo da via. Dos dois lados da residência da mãe, que ele divide com irmãos e o filho Luís Miguel, de 2 anos e oito meses, há escombros de casas que já estiveram ali, mas foram levadas por deslizamentos. "A gente vai ficando até quando Deus quiser. Tem rachaduras que não acabam mais na casa, mas até hoje nada aconteceu."

A área irregular do Chafic, onde moram Santos e Sales e que inclui também o morro do Macuco, é uma das maiores da cidade, mas não existe risco apenas ali. Moradores do Jardim Rosina, Oratório, Ipê e Ingá, entre outros, convivem com o perigo. 

A dona de casa Eunice Maria da Silva, 48, teme que as residências que ficam no morro logo acima da sua caiam. Na Chácara Maria Aparecida, onde ela mora, além do barranco inclinado, há lixo e esgoto, lançado pelos vizinhos do alto. "Meu marido foi até lá falar com eles, mas não adianta. E se essas casas caírem? Nem durmo direito quando chove." É assim a vida de quem se equilibra pelos morros do município.




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