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Igrejas viram vilãs
do barulho na região
Por Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
26/06/2011 | 07:00
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Bares e baladas ainda são o maior motivo de reclamação por barulho no Grande ABC, mas o morador da região convive com outro tipo de som alto: o produzido por templos religiosos. As prefeituras registram por mês, em média, 58 reclamações do tipo, que representam um quarto do total de 242 denúncias por barulho registradas.

A Polícia Militar também recebe ligações por meio do 190. De janeiro a junho deste ano, foram registradas 2.044 denúncias por perturbação do sossego público, sendo que 9,5% delas, ou 195, foram sobre templos religiosos.

Segundo o comandante da Polícia Militar no Grande ABC, coronel Roberval Ferreira França, o papel da corporação é o de mediadora de conflitos. "Apenas as Prefeituras têm poder para fiscalizar, notificar e autuar os locais que ultrapassam o nível de decibéis permitido."

Neste sentido, a cidade que mais recebe denúncias é Santo André, com 28 reclamações sobre igrejas das cerca de 94 recebidas por mês.

Em seguida estão São Caetano e Diadema, com 10 cada, do total de 30 e 40, respectivamente. São Bernardo tem sete denúncias de 60. Mauá tem três de 14 chamados. Em Ribeirão Pires, que registra cerca de quatro denúncias por barulho por mês, não houve neste ano reclamação do gênero. Rio Grande da Serra não respondeu.

No Parque Guaraciaba, em Santo André, a dona de casa Elizabethe Jacomini, 58 anos, convive com o problema. Em frente à sua casa, na altura do número 2.541 da Avenida Queiros Filho, uma unidade da Igreja Pentecostal Deus é Amor tira o sono da família. "Cheguei a dormir na casa da minha irmã para fugir do barulho", contou.

Elizabethe fez reclamações ao Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André). "Os técnicos mediram o volume e indicaram a instalação de porta de vidro na igreja, mas não resolveu", lamentou.

O Semasa informou que foram registrados oito chamados no local, mas as reclamações eram improcedentes. Contudo, o Diário visitou o imóvel em dia de culto e constatou que o som alto invade a residência.

A obreira da igreja Rosa Antonia de Araújo, 55, disse que as queixas são de gente "que não tem luz no coração". Ela disse que a igreja controla o som. "Reclamam da vigília, quando oramos até as 4h, mas isso só acontece algumas vezes por ano."

ORAÇÕES
No Parque São Bernardo, na cidade, outra Igreja Pentecostal Deus é Amor incomoda vizinhos. "Já foi pior, mas o barulho ainda é alto", disse a costureira Luana Benevente da Paixão, 54. Ela é evangélica, mas acredita que não é necessário fazer suas orações em volume alto. "Afinal, Deus não é surdo."

O Diário também constatou o som alto no local, principalmente nas casas que ficam em frente ao templo. Os responsáveis pela igreja não quiseram se pronunciar. A Prefeitura afirmou não ter registrado denúncias.

 

Legislação do silêncio prevê até detenção

A legislação federal pune barulho excessivo por meio de duas leis. O artigo 129 do Código Penal afirma ser crime ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem, de forma a incapacitá-lo para a vida ou o trabalho. A pena é de detenção de três meses a um ano.

O Código Civil também determina, no artigo 1.277, que o proprietário de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

A poluição sonora também pode ser enquadrada na lei federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. O artigo 3º, inciso IV, define como poluidor "a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental".

Os municípios possuem leis e decretos sobre poluição sonora, determinando quantos decibéis são aceitáveis nos períodos noturno e diurno. As legislações prevêem multas e lacração do estabelecimento caso não se regularize ou reincida no abuso. Santo André é a única da região que recebe denúncias 24 horas, que são averiguadas em até 3h30.

 

Templo é multado e faz obras para se adequar

O barulho excessivo não é exclusividade das igrejas da periferia, muitas vezes instaladas em pequenas garagens. Os grandes templos também são alvo de reclamação, como é o caso da Geração Setenta - Avenida Senador Vergueiro, 4.413, Rudge Ramos, em São Bernardo.

A igreja foi alvo de denúncia na Prefeitura em 2010. A primeira notificação para a cessação da emissão de sons e ruídos excessivos foi feita em 10 de outubro.

Depois, a igreja foi autuada pela persistência na infração e pagou multa de R$ 206,50. O problema continuou e o templo pagou nova multa em 21 de novembro, no valor de R$ 413.

O pastor Alexandre Vaz reconheceu o problema e afirmou que o revestimento acústico do prédio está em andamento. "É uma obra cara. Vou gastar cerca de R$ 10 mil, e já pago R$ 17 mil de aluguel por mês. Devo finalizar as intervenções até o começo do ano que vem", estimou o religioso.

Enquanto isso, quem sofre são os vizinhos da Rua Angelo Davi Thomé. O dia mais barulhento é o domingo, segundo os moradores. "O problema não é o louvor, porque a gente tem mesmo de orar. Mas precisa respeitar a vizinhança", opinou a dona de casa Mara Capati, 51.

A administradora de empresas Janete Caltabiano, 51, concorda. "Todos podem rezar e ter a sua crença, mas é preciso respeitar quem tem que trabalhar no dia seguinte", disse.




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