Economia Titulo Restaurantes
Nordestinos dominam ramo de alimentos
Kelly Zucatelli
Do Diário do Grande ABC
10/03/2013 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


Os sotaques dos balcões das padarias do Grande ABC mudaram. E, com eles, o perfil de seus proprietários. Foi-se o tempo em que, ao pedir meia dúzia de pãezinhos franceses ouvia-se a fala arrastada e, muitas vezes incompreensível do português legitimamente vindo de Portugal. O ‘ora, pois' deu espaço ao ‘meu rei', que emenda as frases cantadas típicas do Nordeste.

Junto com a ousadia de colocar suas economias em jogo para atuar em campo tradicionalmente lusitano, os retirantes têm adicionado receitas inovadoras que levam ingredientes nordestinos para cair no gosto do consumidor. Esse movimento vem ocorrendo também em pizzarias e restaurantes japoneses.

Para o economista chefe da Associação Comercial de São Paulo, Marcel Solimeo, essas mudanças que começam a caracterizar o perfil dos empreendedores, mesmo sem pesquisas estatísticas que comprovem a transição, já vêm ocorrendo há algum tempo. "A tendência é que o novo predomine, porém, sempre se atentando ao mercado. É importante não se esquecer do sistema que já existia", detalha Solimeo. O economista ressalta que, para se consolidar em um ramo em que nunca trabalhou, leva-se, no mínimo, cinco anos.

O tempo de adaptação ao segmento escolhido demorou um pouco mais para José Ires de Souza, um dos proprietários da padaria Vitória Régia, de Santo André. Natural do Rio Grande do Norte, ele e seus sócios também rio-grandenses não tiveram medo de apostar no aprendizado da arte de fazer pães e inovar no segmento. "Comecei trabalhando como empregado no ramo da alimentação em 1980, em pizzaria e lanchonetes. Como era um sonho meu e também do meu sócio Raimundo (Moraes), resolvemos nos dedicar a aprender coisas diferentes para incrementar os tipos de pães. Rodamos por muitas padarias de São Paulo", conta o comerciante.

A profissionalização é o diferencial para fazer o negócio decolar. Souza lembra a necessidade do forte investimento em mão de obra qualificada para atuar na panificação e na pizzaria da padaria. "Como não queríamos vender mais só pão e leite, tivemos que buscar a excelência contratando nutricionistas e até graduados em gastronomia. E o resultado é a fidelidade que conseguimos receber dos clientes hoje."

 

DIVERSIFICAÇÃO

Passados anos de dedicação à panificação, os empresários de Santo André agora entram no nicho de oferecer rodízio de comida japonesa todas as quintas-feiras. "Há quatro meses iniciamos nessa parte, após fazer pesquisa com os clientes. Dia a dia procuramos melhorar tanto as receitas quanto a estética dos pratos. Um dos sócios até fez curso para aprender a decorá-los", detalha o proprietário da Vitória Régia.

O presidente do Sipan (Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de Santo André), Antonio Carlos Henriques, vê com olhos de sucesso o trabalho que muitos nordestinos fazem ao longo dos anos dentro das padarias. "Os portugueses introduziram as padarias e os nordestinos deram o toque de inovação com diferenciais bem característicos da cultura brasiliana."

 

JOVENS

Essa tendência é reforçada pelo ingresso cada vez maior de jovens empreendedores que, em sua maioria, optam pelo segmento de prestação de serviços. Dados do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) apontam para o crescimento da fatia de profissionais entre 25 e 34 anos que têm optado por ter o próprio negócio. No Brasil, o aumento no ano passado foi de 19,2%, enquanto na região Sudeste, o avanço atingiu a casa de 16,9%. A segunda faixa etária que despontou para esse perfil foi parcela entre 35 e 44 anos, registrando 18,7% de crescimento no País e 17,1% na região Sudeste.

 

Comida de gringo com toque brasileiro - O convite de um tio para comer em restaurante japonês há 19 anos fez com que o cearense Antônio Vieira Lima, conhecido como Neto, despertasse para a vontade de conhecer a fundo o ramo da gastronomia japonesa e deixar um pouco de lado o sarapatel e a galinha de pirão. "Admirava a maneira como o sushiman manuseava o corte dos peixes e fazia os sashimis. Resolvi procurar cursos para aprender e deu certo", conta.

Depois de trabalhar gratuitamente para adquirir experiência, o empresário, que comanda o King Sushi, em Santo André, salienta que hoje existem diversas opções de cursos para aprendizado e aperfeiçoamento da profissão, que oferece salário de até R$ 3.000 por mês. "Trabalhei como frentista e em uma lanchonete, e a minha preocupação sempre foi mergulhar na cultura da culinária para oferecer o melhor para o cliente. Não basta dizer que já é expert em culinária japonesa se uma vez ou outra prepara algum prato de maneira informal. Existe muito disso por aí. Tem que conhecer a fundo", diz Neto.

De modo geral, o comerciante vê mais sucesso nos sushimans que não são orientais, pois acredita que eles podem criar e fazer adaptações para agradar mais ao brasileiro. "Os japoneses nasceram comendo esse tipo de comida. Eles não têm mais tanta curiosidade para inventar pratos", brinca.

O setor hoteleiro da região também tem mudado nesse aspecto. "Antes, muitos hotéis eram de portugueses, hoje os japoneses e chineses têm tomado esse mercado", ressalta o presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do Grande ABC), Roberto Moreira.




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