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Ai se fosse uma cobra

Existem coisas aparentemente insignificantes que fazem parte...

Por Carlos Ferrari
20/02/2013 | 00:00
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Existem coisas aparentemente insignificantes que fazem parte de meu cotidiano e de tantas outras pessoas cegas, que às vezes parecem tão naturais e, por isso, acabam passando despercebidas. Felizmente, sempre tem algum amigo por perto que, de um jeito ou de outro, fala mais ou menos o seguinte: ‘Essa tem que anotar, guarda aí e conta no blog e lá no jornal'. 

Assim aconteceu na semana passada, logo depois que tomei um banho de meu segundo copo de chope, tão esperado depois de um brinde que celebrou um dia intenso de trabalho. 

Após pedido feito, copos trazidos, pessoas servidas e muita boa conversa, me preparei para mudar de assunto e falar da demora da casa para nos atender, afinal, já fazia um tempinho que havíamos pedido e nada... Bem, quando pensei no nada, veio o tudo, ou seja, o copo que pensei que não havia chegado, estava ali, e um movimento mal calculado fez com que eu batesse de tal forma em meu desejado, porém não anunciado, segundo pedido, que o banho fosse inevitável. 

Além de uma risada molhada, e da preocupação com o celular que quase se afogou em meio ao acidente, a frase já usada em outras situações idênticas veio de novo, como se fosse quase um sopro de racionalidade, ou melhor, de uma leitura pragmática e não menos bem-humorada daquela ‘lambança' toda, ‘ai se fosse uma cobra'. Felizmente, meu molhado e gelado companheiro de boas conversas não era, sequer de longe, da família dos répteis venenosos, apesar que há quem diga que, se ingerido em grande quantidade, pode provocar uma espécie de ‘envenenamento' temporário, com efeitos significativos, principalmente na manhã seguinte a tal exagero. 

Mas, depois do pequeno susto, conversamos bastante sobre o ocorrido, inclusive com o simpático senhor Américo, que atendia a nossa mesa e se mostrou profundamente constrangido com a situação, sobre o quanto se faz necessário prepararmos nossa mão de obra de serviços importantes, como bares, hotéis e restaurantes para atenderem públicos diversos.

Tal necessidade aplica-se a todos os serviços ofertados em uma sociedade, que cada vez mais se propõe a ser ‘de todos' e ‘para todos'. Contudo, em alguns setores parece que tais demandas ficam para segundo plano, afinal, quem vai imaginar pessoas com deficiência jogando conversa fora em um botequim lotado de alguma de nossas disputadas esquinas em noites quentes de calor. 

O normal é pensar que tais pessoas pudessem estar em algum hospital ou talvez até em um espaço religioso buscando a cura, ou quem sabe em casa estudando, bordando, ou tocando angelicalmente algum instrumento. Bem, provavelmente, de fato, em um universo de mais de 45 milhões de pessoas com deficiência, segundo o último Censo do IBGE, de 2010, sem dúvidas, em um País continental como o nosso, tem gente fazendo tudo isso, e muitas outras coisas, que não caberiam neste texto.

Por ora, nos basta pensar que com um pouco de esforços coordenados e bem pensados, podemos, em um curto espaço de tempo, ter trabalhadores bem mais preparados para receber com qualidade pessoas, sejam elas com ou sem deficiência, idosos ou jovens, pobres ou ricos, enfim, precisamos de pessoas preparadas para atender pessoas, respeitando a diversidade humana, e seus direitos conquistados ao longo de séculos. E para finalizar, vale a pena lembrar você de quando for servir algo para algum amigo ou cliente cego, não se esqueça de avisar, pois se o cara for distraído como eu, vai comer comida fria, ou tomar banho de chá gelado, café quente, e outros tais...  

* Carlos Ferrari é presidente do CNAS (Conselho Nacional de Assistência Social) e vice-presidente da Fenavape (Federação Nacional das Avapes).




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