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Dia de luta

Sobre o dia 21 de setembro costumamos dizer que não é o Dia Nacional de Luta pelos Direitos da Pessoa com Deficiência

Por Carlos Ferrari
22/09/2010 | 00:00
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Sobre o dia 21 de setembro costumamos dizer que não é o Dia Nacional de Luta pelos Direitos da Pessoa com Deficiência, já que esse é todo dia, mas sim o dia em que paramos para celebrar todas as conquistas, identificar os desafios e dar as mãos para mostrar juntos: familiares, pessoas com deficiência, profissionais da área, amigos e tantos outros, o quanto que ainda precisamos caminhar.

Curiosamente, foi nessa semana que vivi uma das maiores violências de direito por mim já enfrentadas.

Sem medo de errar, posso dizer que dia 17 de setembro deste ano foi o dia mais especial de minha vida até aqui.

Tudo começou bem cedo, visto que o grande momento estava agendado para as sete da manhã. Orações, abraços e um pouco de um monte de outras coisas foram acontecendo até as exatas 7:22, momento em que parece que o mundo inteiro parou para contemplar a chegada da doce e linda Catarina, nossa primeira filha.

Acompanhar o parto dentre tantas emoções foi um momento daqueles que reservam espaço VIP na memória. O hospital e maternidade, referência para todo o ABC, me encheu de orgulho por ser de Santo André. Equipe atenciosa e de profissionalismo inquestionável, para além de tudo o que já fazia com maestria, todo tempo se preocupou com a acessibilidade, descrevendo para mim os momentos e destacando pessoas para dar suporte durante o processo, desde a ida ao centro obstétrico até o retorno de encontro às vovós ansiosas por notícias.

Às 15h então seria mais um momento único a ser registrado: a emissão do primeiro documento, a certidão de nascimento daquela que, tenho certeza, será uma grande cidadã. Fiquei feliz com a notícia de que esse serviço era oferecido na própria maternidade, visto que isso me permitiria ficar mais tempo acompanhando minha mulher, ainda sob os efeitos de uma cesárea, e minha menina, em suas primeiras horas de vida.

Dirigi-me até o posto avançado do cartório, acompanhado de minha mãe e de um primo, sabendo que pessoas cegas, sempre que vão se utilizar desses serviços precisam fazê-lo com duas testemunhas. A alegria era tanta que isso naquele momento, ao contrário de outras vezes, nem me incomodava tanto.

Chegando lá, porém, me fora dito que eu não poderia assinar o termo de registro. Quem poderia reverter essa ordem era exclusivamente alguém que o atendente Marcelo, muito educado por sinal, chamava de oficial.

Pedi então um documento que dissesse o motivo dessa proibição, e de novo recebi a informação de que apenas o oficial poderia tratar disso. Solicitei ao atencioso rapaz que ligasse para o tal homem detentor de tantos poderes para além da constituição. A resposta veio em alguns minutos acompanhada de uma pergunta: "sua esposa enxerga?" Após a minha afirmativa, ele me disse que ela então poderia assinar o termo de registro.

Em meio aos efeitos da anestesia, enjoada e enojada por tanta agressão à cidadania, minha mulher nos recebeu no quarto, para que respeitássemos a alternativa posta pelo poderoso oficial. Se não fosse assim, teríamos que ir até ele, afinal como se pode ver não tínhamos outra opção.

Catarina hoje está devidamente registrada. É uma cidadã e será educada para ter em sua certidão de nascimento uma bandeira para combater atitudes como as que nortearam a emissão de seu documento.

Eu assumo neste espaço o compromisso público de continuar lutando e em breve espero trazer notícias de que outros andreenses definitivamente estejam livres desse tipo de violência aos seus direitos.




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