Cultura & Lazer Titulo
Fotógrafo critica em imagens a destruição da Amazônia
Por Ricardo Ditchun
Do Diário do Grande ABC
21/11/2005 | 08:19
Compartilhar notícia


Manifestação artística, a fotografia subverte, informa, propõe, investiga, denuncia, documenta, cobra, ousa, acusa, revoluciona e, inclusive, encanta. No caso das imagens de Araquém Alcântara, o mais notável fotógrafo de natureza em atividade no Brasil - precursor dessa modalidade no país, aliás -, essas características, aliadas, arrebatam o observador de tal forma que logo se percebe que atrás dos equipamentos há algum tipo de importante projeto estético e político em curso.

Não dá para ver bicho, gente ou lugar flagrado por esse artista sem comprometimento. Araquém carrega no sangue uma das mais belas e corajosas tradições culturais de nosso país: a mesma de Guimarães Rosa, de Euclides da Cunha, de Graciliano Ramos, de Ariano Suassuna... Seu olhar está no foco da onça pintada, do anacã, do uacari branco, do ouriço-cacheiro, da cobra-espada, da paca-de-rabo. Está na elegância do menino quilombola, na fadiga muscular do coletor de piaçaba, na saúde exuberante dos vaqueiros, na concentração e na serenidade dos índios caçadores Zo'é. Está na explosão de cores e formas dos biomas brasileiros e nas muitas situações de agressão cometidas contra a natureza e, por conseqüência lamentável, na não-ação do Estado e na indiferença da opinião pública.

Araquém está de livro e exposição novos. Amazônia (Terrabrasil, 240 págs., R$ 230) e a mostra Bichos do Brasil serão apresentados ao público na quinta-feira (dia 24), às 19h, no Museu da Casa Brasileira, em São Paulo. O livro (29cm x 32cm), o 21º de sua carreira, reúne 132 imagens coloridas divididas nas partes Terra, Homem e Destruição. Assinam textos - todos imprescindíveis - sobre o bioma amazônico, o médico e escritor Drauzio Varella, o poeta Thiago de Mello, o geógrafo Nacib Aziz Ab'Saber, a antropóloga Betti Mindlin, o especialista em ecoturismo João Meirelles Filho, o jornalista Roberto Smeraldi, o sertanista Sydney Possuelo e o escritor Márcio Souza. Na noite de lançamento, será vendido a preço promocional: R$ 150.

A mostra é uma seleção com 25 imagens em grande formato (2m x 1m). Apresenta um pouco da diversidade da fauna da região, particularmente do médio Solimões, do norte paraense, dos parques nacionais da Amazônia e do Cabo Orange (AP) e da reserva de Mamirauá, no Amazonas.

xAraquém, desta vez, neste novo trabalho, assina um protesto como talvez jamais tenha feito de modo tão contundente. "É a questão da urgência", explica. "Estamos perdendo a luta por causa da ganância e da ignorância". E as duas críticas têm endereço certo: madeireiros e plantadores de soja e o Estado. Aqueles, sujeitos de ações nocivas, mas respaldadas em princípios legais que dão margem a interpretações canhestras. Este, inapto - mais uma vez - na tarefa de propor uma viabilidade econômica criativa e eficaz para milhões de amazônidas.

"Minhas últimas viagens pela Amazônia mostraram um quadro terrível. Há risco iminente por todos os lados: fumaça, mares de soja, índios que se transformam em bandidos, cidades feias, corrupção, grilagem, miséria, queimadas, fumaça... O processo de savanização da região é um dado real pois a floresta é frágil. A Amazônia vive seu estágio de esgotamento. O processo é de morte", relata, angustiado, mas não desesperançado, o fotógrafo catarinense de 55 anos (35 de profissão) que adotou Santos como endereço e, mais recentemente, a capital paulista.

Segundo Araquém, a solução não pode demorar, a fim de recompor princípios de vida social e de auto-estima da população da região, frear as queimadas e a derrubada de árvores, bem como o avanço inescrupuloso das fronteiras agrícolas. "Moratória da devastação, manutenção e aprimoramento da política de turismo responsável, construção de uma política ambiental verdadeira e comprometimento com a revolução tecnológica e científica que pode ser realizada segundo atestam importantes estudos acadêmicos sobre a região. É disso que se trata", afirma. E completa, após refletir por um instante: "É muita coisa para governantes despreparados."

Araquém não chegou a presenciar os efeitos da longa estiagem que ocorre atualmente na Amazônia. Quando seus fortes efeitos tiveram início, ele já estava de volta, e o livro Amazônia, cumprindo sua intrincada trajetória técnica a cargo da Pancrom Indústria Gráfica, parceira do artista no projeto. "Dá para imaginar minha vontade de brecar tudo, pegar meu equipamento e documentar também esse momento. Mas isso já é outra história", completa.

Amazônia e Bichos do Brasil - Lançamento do livro e da exposição do fotógrafo Araquém Alcântara. Quinta-feira (dia 24), a partir das 19h. No Museu da Casa Brasileira - av. Brigadeiro Faria Lima, 2.705, São Paulo. Tel.: 3032-2499. Preço do livro: R$ 230 (R$ 150 na noite de lançamento). Ingr. para a exposição: R$ 4 (meia-entrada para estudantes com carteirinha). De terça a domingo, das 10h às 18h. Até 23 de dezembro.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;