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‘Chave-Mestra’ traz mais do ‘cinema de assombração’
Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
26/08/2005 | 08:11
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A Chave-Mestra, outro filme de terror no panorama contemporâneo de assombrações cinematográficas por atacado, principalmente daquelas importadas de terras nipônicas. A Chave-Mestra, não coincidentemente, outro filme com o dedo de algum figurão envolvido no hit O Chamado – neste caso, o roteirista Ehren Kruger. A Chave-Mestra, enfim, uma obra dirigida por Iain Softley e que não traz lampejo algum para o gênero, aparentemente espremido até o bagaço conforme diagnosticava o recente Água Negra, incursão do brasileiro Walter Salles pelo terror de olhinhos puxados. A Chave-Mestra, estréia de sexta-feira em cinco salas da região, fora o circuito paulistano.

Softley, para quem não relacionou o nome à pessoa, tem como trabalho mais célebre o longa Backbeat – Os Cinco Rapazes de Liverpool (1994), que dramatizava a história de Stu Stewart, o quinto Beatle. De resto, fez uma ou outra amenidade artística como K-Pax (2001) e Asas do Amor (1997).

Meteu-se a realizar um filme de terror, e avizinhar-se do cinema do gênero. Não vai muito além de massagear estereótipos, a começar pelo da casa mal-assombrada, visitado e revisitado incansavelmente em produções como O Grito e Água Negra. Caroline (Kate Hudson, de Quase Famosos) trabalha como enfermeira doméstica e tem lá a culpa de uma história mal-resolvida com o próprio pai, morto em conseqüência de uma negligência sua. Os motivos pessoais que decoram todo bom personagem de ficção estão pois expostos e funcionam como um atalho para que Caroline – nome este que faz tremer todo cidadão que um dia parou para assistir a Poltergeist (1982) – aceite o emprego para cuidar de um velho moribundo, Ben (John Hurt), numa propriedade rural.

A decrepitude do velho parece tão estável quanto a tranqüilidade da casa que ele divide com a mulher, Violet (Gena Rowlands). Mas estamos tratando de um filme de gênero (no caso, o terror) que se licencia de discutir ou mesmo de contestar as ferramentas e os códigos que o fazem inteligível – para não dizer mastigado demais. Portanto, o marasmo todo, do paciente e da casa, são só fachada.

A Chave-Mestra prossegue que é uma beleza, na sua confortável planície de expectativas. O mistério que ronda a casa e o velho, que tem chiliques quando confrontado a um espelho, começa a ser desvendado quando Caroline tem acesso a uma chave que abre o sótão da construção. Lá, estão depositados objetos como discos de vinil, cabelos e instrumentos que supõe-se pertencentes a praticantes de magia negra, mais especificamente vodu, que habitavam o lugar décadas atrás. Pronto: as cartas do filme-padrão de terror estão na mesa e Softley não derrama um pingo de suor para embaralhá-las ou mesmo para ordená-las de modo a desviar-se de um monótono pife-pafe cinematográfico e criar um jogo pessoal com o passado (a morte, por linchamento, dos feiticeiros que habitavam e agora assombram a casa), o presente (a descoberta desse mal, que é conseqüência de um mal anterior, a violência do linchamento) e a iconografia dentro da qual se enquadra o vodu, menos um elemento espiritual e cultural do que uma justificativa exótica aos devaneios imateriais do filme.

O tratamento que A Chave-Mestra dispensa à sua matéria mística envereda por esse estranhamento, por esse exotismo, por pura falta de perícia. Importa o vodu para seu conteúdo na tentativa de incrementar o gênero do terror. Incrementaria mais caso não o tratasse com o despeito de quem o compreende como fábrica de assombrações para o usufruto do mainstream, e não como cultura. Por isso, a dada hora, é até justificável que o espectador comece a imitar as exclamações da protagonista Caroline: “Eu não acredito”.

A CHAVE-MESTRA (The Skeleton Key, EUA, 2005). Dir.: Iain Softley. Com Kate Hudson, John Hurt, Gena Rowlands. Estréia nesta sexta-feira no ABC Plaza 5, Shopping ABC 2, Extra Anchieta 6, Metrópole 3, Mauá Plaza 2, Central Plaza 2 e circuito. Censura: 14 anos.



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