Cultura & Lazer Titulo
Uma homenagem brasileira a Nino Rota
Por João Marcos Coelho
Especial para o Diário
25/08/2001 | 16:05
Compartilhar notícia


Federico Fellini lhe deve muito, outro tanto o norte-americano Francis Ford Coppola e até Lucchino Visconti – enfim, o cinema mundial não seria o mesmo sem a música de efeitos mágicos composta por Nino Rota ao longo de uma carreira de praticamente 40 anos, interrompida por sua morte em 1979. Rota completaria 90 anos no próximo dia 3 de dezembro, e a Kuarup, gravadora independente carioca tocada com inteligência e dedicação por Mário Aratanha, coloca nas lojas um CD que é um tributo: Nino Rota por Solistas Brasileiros (R$ 25 em média). Concebido dez anos atrás por José Carlos Botezelli, o Pelão, famoso por ter descoberto Cartola, o CD foi brinde da Cica em 1991 e só agora ganha uma edição comercial.

Em boa, ótima hora, já que Pelão conseguiu reunir feras da música instrumental brasileira. Nomes como Rafael Rabello, o violonista que nos deixou tão cedo e era tão bom; o bandolim de Joel do Nascimento; o piano do Tio Laércio de Freitas; Chiquinho do Acordeom; uma inesperada e bela parceria do sax-soprano de Zé Nogueira com Guinga ao violão no tema eterno de Amarcord. Tudo isso sem contar a viola caipira de Roberto Corrêa, a um só tempo popular e refinada; e, para mim, a grande faixa do disco, Bevette Piu Latte com Zé Gomes e sua rabeca em solo inesquecível. Ah, tem Theo de Barros e seu sutil violão em La Strada.

São solistas em estado puro, sem grandes volumes sonoros para atrapalhar, ali, postos em sossego com seus instrumentos, cada um dedilhando num à-vontade formidável estes temas que fizeram a glória de Nino Rota. Engraçado como Rota emprestou à música para cinema uma dignidade que a faz existir separada das imagens: é música que tem suas próprias qualidades, sem deixar de integrar-se à perfeição com as imagens.

Distorções – Na passagem de seus 90 anos, deve-se corrigir ao menos duas distorções graves que gravitam em torno do nome de Nino Rota. A primeira é que ele só compôs para os filmes de Fellini (e, de fato, Rota assina a trilha sonora de todos os filmes de Fellini até sua morte). Basta ouvir a música incrível que ele compôs para clássicos como Rocco e Seus Irmãos, de Visconti, Guerra e Paz, de George Vidor, Romeu e Julieta, de Franco Zefirelli, O Poderoso Chefão I e II, de Coppola etc.

A segunda não é nem uma distorção, mas uma descoberta que traz consigo quem sabe a principal razão de sua música ser tão criativa e diferenciada: é sua cultura musical erudita.

Rinaldi Rota, nascido em Milão em 3 de dezembro de 1911, estudou música a sério: aos 11 anos, compôs o oratório L’Infanzia di S. Giovanni Battista. Em 1923, foi admitido no Conservatório de Milão, e adquiriu uma sólida cultura musical.

Em 1930, Rota foi para os Estados Unidos, e estudou no exclusivo Curtis Institute da Filadélfia, celeiro de várias gerações de compositores, maestros e grandes músicos norte-americanos. O maestro Fritz Reiner foi seu professor de regência e Rosario Scalero deu-lhe aulas de composição. De volta à Itália, estudou literatura na Universidade de Milão, formando-se em 1937, e no ano seguinte começou a ensinar música em Tarento e em seguida no Liceu Musical de Bari, do qual foi diretor durante 28 anos, entre 1950 e 1978.

É esta a razão que o faz brincar com todos os estilos musicais. Nos anos 90, esta nova imagem musical de Rota emergiu por meio de inúmeras gravações de sua produção erudita, culminando, em 1999, com a gravação, pela EMI, de seus dois concertos para piano e orquestra com a Filarmonica della Scala de Milão regida por Riccardo Muti e tendo como solista a jovem pianista Giorgia Tomassi. Giorgia, coincidentemente, apresenta-se nos dias 2 e 3 de outubro próximo pela primeira vez no Brasil, no Espaço Cultural Promon, em um recital dentro da série Noites Especiais BankBoston. Pena que em sua estréia brasileira Giorgia não toque Rota. Em compensação, ela fará Bach, Liszt, Granados e a imponente Sonata nº 7, de Prokofieff.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;