Política Titulo Especial Lula
De mito a investigado em varredura firmada pela PF

Ex-metalúrgico ascendeu politicamente após liderar greves na região durante ditadura e hoje está no epicentro de esquema

Por Fabio Martins
Do Diário do Grande ABC
05/03/2016 | 07:00
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Nascido no Interior de Pernambuco, em 1945, filho de analfabetos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ascendeu à vida pública depois de liderar as greves dos metalúrgicos do Grande ABC em pleno período de ditadura militar. Junto com outros operários, ele fundou, em 1980, o PT, hoje considerado um dos principais partidos do País. Atuou como deputado federal. Após três campanhas eleitorais frustradas ao Planalto, o petista sagrou-se vencedor do pleito majoritário de 2002 ao mudar sua postura. Foi reeleito em 2006, deixou a Presidência com altos índices de aprovação e conseguiu, por meio de sua popularidade, eleger sua sucessora, Dilma Rousseff (PT), feito inédito.

Os governos de Lula (2003 a 2010) ficaram marcados pela implementação de programas sociais, como de distribuição de renda e acesso à universidade, através do ProUni, além de projetos de moradia popular, infraestrutura e saneamento básico. Manteve a estabilidade da moeda. Devido ao perfil adotado no Planalto, o ex-chefe da Nação é destacado entre as principais lideranças do Brasil, e também tem reconhecimento fora dos limites nacionais.

Tornou-se espécie de ‘mito’ no meio político, em especial na região, berço do petismo, onde, em 2012, último páreo municipal, por exemplo, como cabo eleitoral auxiliou a legenda a ganhar três prefeituras (Santo André, São Bernardo e Mauá). É cotado novamente à disputa presidencial em 2018. Por outro lado, investigação da Polícia Federal e do Ministério Público colocam o petista no epicentro do escândalo de corrupção da Petrobras. A situação provoca desgastes.

Ao sair do poder, Lula assumiu agenda, principalmente, internacional, realizando palestras e provendo seminários, por intermédio da empresa Lils, sob seu comando. São apurados pagamentos ao petista, firmados por empresas investigadas na Operação Lava Jato, a título de supostas doações e pagamento de palestras. Para a procuradoria, “há evidências de que o ex-presidente recebeu valores provenientes do esquema da Petrobras através da destinação e reforma de um apartamento triplex (no Guarujá) e de um sítio em Atibaia, da entrega de móveis de luxo nos dois imóveis e da armazenagem de bens por transportadora”. As investigações apontam por suposto favorecimento pessoal.

Conforme as averiguações levantadas, as autoridades vasculham se os recursos vieram de desvios da estatal e se foram utilizados de forma lícita. Parte do dinheiro foi transferida do Instituto Lula para empresas de filhos do ex-presidente, e o MPF apura se os serviços foram de fato prestados pelas companhias. “Os favores são muitos e são difíceis de quantificar”, alegou o procurador da República Carlos Fernandes Santos Lima, em entrevista coletiva ontem, sobre relação do ex-presidente com as empreiteiras. “Não há nenhuma conclusão no momento, mas os indicativos eram suficientes.” Não houve pedido de prisão para o petista.

As ações de busca e apreensão, aliadas ao pedido de condução coercitiva de 11 pessoas, deflagradas na 24ª fase da operação, indicam os rumos da investigação. O Instituto Lula negou envolvimento do ex-presidente em irregularidades apontadas na Lava Jato e diz que ele nunca cometeu qualquer ilegalidade. Apoiadores do ex-chefe do Planalto defenderam conotação política no episódio. O petista considerou que a ação da Polícia Federal foi excessiva e desnecessária. “Eu acho que eu merecia um pouco mais de respeito neste País”, disse, na sede do diretório nacional do PT, depois de concluir depoimento em que foi levado de forma obrigatória à unidade da Polícia Federal.

Em 2008, Lula recebeu o Diário em Brasília

Em 23 de julho de 1978, Luiz Inácio da Silva, que ainda não tinha Lula no nome, deu sua primeira declaração para um meio de comunicação: o Diário. Trinta anos depois, em 27 de abril de 2008, era publicada a única entrevista exclusiva dele ao jornal sentado na cadeira de presidente da República, em Brasília.

Com estilo repaginado por marqueteiros, Lula falou de sua trajetória, da atuação dos sindicatos, Saúde, reforma tributária, inflação, alta dos juros, biocombustíveis. Discorreu sobre família e até Corinthians, sua paixão futebolística. Disse que o PT de São Bernardo cometeu erros – havia perdido a Prefeitura anos antes. Mas o que marcou, de fato, foi sua análise acerca do panorama político nacional, no alto da experiência de cinco anos e meio de governo naquele momento.

Criticou indiretamente seu rival Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que havia lhe passado a faixa em 1º de janeiro de 2003. “Vou ensinar como um ex-presidente precisa se comportar. Ex-presidente não tem de dar palpite. Se chamado, dá opinião. Se não chamado, fica quieto. Essa é a contribuição que eu posso dar.” Lula não cumpriu o que disse. Tanto nos bastidores quanto publicamente dá seus pitacos e atua efetivamente na condução do Brasil.

Seu desejo, naquele abril de 2008, era terminar o segundo mandato – faltavam pouco mais de dois anos e meio – “com saúde e eleger meu sucessor e deixar a pessoa eleita governar o País”. E depois disso? “Aí vou viver minha vida em São Bernardo.” Lula conseguiu o que queria. Dilma Rousseff (PT), sua indicada à sucessão, venceu a eleição de 2010 e foi reeleita em 2014. Mas, mal sabia ele que oito anos após aquela entrevista sua vida na cidade do Grande ABC não seria tão tranquila como gostaria. 




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