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Alvarenga e a multidão à beira da Billings
Debora Moreira
08/08/2011 | 07:01
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Tiago Silva/DGABC


Localizado às margens da Represa Billings, o bairro dos Alvarenga, em São Bernardo, é exemplo de crescimento desordenado. Sem ter para onde ir, muitos fixaram moradia na região, principalmente no início da década de 1970, com a inauguração da Rodovia dos Imigrantes, formando diversas favelas. Atualmente, são cerca de 63 mil habitantes, em um área do tamanho de São Caetano.

Grande parte da população (67%) é proprietária de seus imóveis, paga IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) porém não possui escritura por se tratar de área de manancial. Mesmo proibido por lei o registro de imóveis, é possível a divisão do terreno para cobrança de impostos.

A dona de casa Márcia Maria de Jesus, 53 anos, mora no local há nove anos, com o marido, três filhos e a mãe de 70 anos. Não se lembra quanto pagou na residência de três dormitórios, sala, cozinha e três banheiros. Mas pediu recentemente a avaliação e diz ter descoberto que vale R$ 180 mil. "Nada mal para quem chegou aqui com uma mão na frente e outra atrás", comenta Márcia, que chegou ao Estado com meses de vida. Sua mãe, que era empregada doméstica em fazenda em Teófilo Otoni (MG), decidiu deixar a cidade, depois de ter sido rejeitada pelo pai da criança, que ra o filho do dono da fazenda.

Já a autônoma Terezinha Aparecida de Sousa Pereira, 47, chegou de Cachoeira Paulista, no Interior, há quase 30 anos. Viu o bairro crescer e hoje não consegue deixá-lo. "Estamos todos acostumados aqui. Apesar de ser periferia é mais tranquilo do que muito lugar por aí. Me adaptei muito fácil por causa desse clima de interior", conta Terezinha, que mora com o marido e dois filhos.

 Nos últimos anos, o Alvarenga ganha ares de urbanização. As estradas de terra deram lugar a vias asfaltadas e iluminação, além de desenvolvimento do comércio, instalação de agência bancária, lotérica e equipamentos públicos.

 Apesar de haver muitas escolas, unidades de saúde e até delegacia, muitos reclamam da falta de áreas de lazer e cultura.

 "Não temos quadras esportivas nem parques. Jogamos bola aqui nesse campo improvisado na beira da represa", lamenta Paulo Esdaras Alves, 45. Ele atua como monitor há três anos nas escolinhas de futebol do Projeto Tigrinho, da Prefeitura em parceria com o São Bernardo Futebol Clube. No bairro são atendidos 110 meninos e meninas, entre 7 e 16 anos.

 Paulo mora desde 1992 com a mulher e duas filhas e de lá não quer sair. "Falta espaço para a garotada, mas aqui a gente vive em paz e tranquilidade", conclui.

Região conserva hábitos do Interior

Morar na beira de uma represa tem suas vantagens. Assim pensa o catador Antonio Pereira, 61 anos, vizinho da Billings há 20. Para ele, mudar de casa significa trocar de profissão. Ao lado da residência, ele mantém a égua, 6 anos, que puxa a carroça onde coloca o material coletado nas ruas de São Bernardo.

 "Não seria possível morar em outro lugar. Tenho esse animal e aqui consigo deixá-lo em segurança e sem receber reclamações", justifica Antonio, que ganha cerca de R$ 700 com o trabalho. Sanfona foi adquirida há dois anos por R$ 2.000 para substituir o cavalo Baio, que morreu de velhice depois de 16 anos de serviços prestados. Para acomodá-la, improvisou cocheira feita de madeira e portão de ferro. Diariamente, diz que gasta cerca de R$ 10 com ração e manutenção, como troca de ferraduras.

A dona de casa Patrícia conceição Silva, 46, nascida no município e moradora do Alvarenga há 12 anos, acha graça no fato de o lugar ainda guardar características rurais. "Parece roça. Temos vaca, cavalo, patos e até garça. Acabei me acostumando. Só acho que deveria ter mais padarias. Pão fresquinho só quando me animo a andar um pouco mais", comenta Patrícia.

Por conta do clima, viver ao lado de uma represa tem suas inconveniências. No calor, em virtude do esgoto lançado diretamente nas águas, há mau cheiro. Durante o inverno, o vento frio soprado sobre seu leito torna o local gelado.

O Alvarenga está localizado no sudoeste da cidade, a cerca de oito quilômetros da região central. É dividido em diversas regiões como Jardim Laura, Porto Novo, Sítio das Garças, Acampamento dos Engenheiros, Parque dos Químicos, Jardim das Orquídeas e Sítio Bom Jesus.

 

Briga entre vizinhos é ocorrência mais comum

Desde que o 8º Distrito Policial foi instalado na região, em 2007, o número de assaltos ao comércio da Estrada dos Alvarenga, que corta todo o bairro, tem diminuído, segundo comerciantes. No entanto, ainda há quem queira vender o estabelecimento.

É o caso da proprietária Veridiana Santos, 49 anos, que há seis mantém uma lanchonete. Já foi assaltada 18 vezes e não sabe mais o que fazer para evitar. "Mudei da sobreloja onde vivia para pelo menos não correr o risco de ser acordada no meio da noite com arma apontada para mim. Agora mal consigo contabilizar o prejuízo", lamenta. Segundo a comerciante, o período mais complicado é o noturno.

Já Dorival Santana Cardoso, 37, dono de pet shop há uma década, comemora a redução dos assaltos. Já foi roubado oito vezes, mas nos três últimos anos percebeu a redução.

"Antes da delegacia havia base comunitária móvel atendendo aos nossos pedidos. Aposto muito nessa região. Lembro de quando tudo era terra e com postes ainda de madeira. Hoje temos até agência bancária", afirma o comerciante.

Segundo o escrivão chefe da Polícia Civil Alcides Cestari, que atua no 8º DP desde o início do ano, cerca de 300 boletins de ocorrência são registrados ao mês, incluindo os casos atendidos pelo plantão do 3º DP, aos fins de semana. O distrito funciona de segunda a sexta-feira, das 9h às 19h, na Estrada dos Alvarenga, 3.517. Há registro de um homicídio a cada dois meses.

"A grande maioria das ocorrências está relacionada aos problemas sociais, como ameaça, injúria, difamação e lesão corporal. Ou seja, há muita briga entre vizinhos. É uma região populosa onde todos são obrigados a conviver em reduzido espaço", explica o escrivão chefe.

A área abriga o Centro de Detenção Provisória e, mais recentemente, duas unidades de internação da Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente).




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