Cultura & Lazer Titulo
Riqueza do universo
Sílvio Lancellotti
Especial para o Diário
03/02/2007 | 18:35
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Acredite se quiser,mas, do ponto de vista da botânica, a planta que produz a banana é uma erva, a maior do planeta no seu departamento. Ostenta um longo tronco subterrâneo, ou rizoma, do qual, acima do solo, brotam folhas que se enrolam e formam um caule suposto. Depois do justo crescimento e da maturação da planta, na parte superior do falso caule pendem cachos de frutos, que a ciência prefere chamar de pseudobagas, pseudo por não possuírem sementes. Quando se colhem os cachos, o caule suposto tende a morrer, ou precisa ser eliminado. Mas, não se assuste, logo nasce, do mesmo rizoma, um novo falso caule.

A própria história da banana explica esse prodígio da natureza. Provém do sudeste da Ásia, mais especificamente de Papua, na Nova Guiné, onde os povos locais conheceram as suas propriedades reprodutivas cerca de 10 mil anos atrás – e, digamos assim, a domesticaram. Por lá, ainda se encontra a banana selvagem, com sementes. De todo modo, a partir da sua bela expansão através da geografia do universo, as sementes se tornaram cada vez mais desnecessárias. Uma planta redunda em outra, espontaneamente. Documentos budistas do século VI a.C. mencionam as suas qualidades. Alexandre Magno se deliciou com a banana, na Índia, em 327 a.C. Os chineses a cultivaram, de maneira extensiva, a partir do século III. Por volta de 650, os conquistadores islâmicos a introduziram nas suas plagas, da Arábia à Turquia e nas costas ao norte e ao leste da África. Do Século XV em diante os navegadores espanhóis e portugueses a cultivaram, largamente, nas três Américas e no Caribe.

Hoje, a banana existe em mais de 130 países. Como alimento do dia-a-dia, o mundo só consome, em maior volume, o arroz, o trigo e o milho. O Brasil ocupa o segundo posto internacional no ranking da produção, cerca de 6,7 milhões de toneladas, atrás somente da Índia, 16,8 milhões. Na relação das despesas com a alimentação de nossa gente, porém, a maravilha não passa de 0,9%. Deriva do seu preço barato, claro, a expressão “a preço de banana”.

Das variedades que se multiplicaram pelos continentes, ao menos quatro se destacam nas mesas dos comensais: a pequenina e saborosíssima banana-maçã; as fartas banana-da-terra e banana-prata; e a banana-nanica, que é vasta, no seu volume, mas recebeu o apelido pela miudez da sua planta materna.

Ainda verde, a banana oferece, meramente, uma proporção de perto de 75% de água e 25% de amido, mais traços de vitaminas e de sais minerais. Em tal situação, tem uma textura rija e um gosto adstringente, pega na boca. Com o seu amadurecimento, o amido se transforma em açúcares, como a glicose e a sacarose, os sais minerais se concentram. Os macacos não apreciam a banana impunemente – fornece praticamente todos os nutrientes de que precisam.

Uma das alquimias mais tradicionais do Litoral do Estado de São Paulo foi batizada pelos caiçaras de azul marinho: cozinham-se postas de peixe, badejo ou garoupa, entre diversos temperos e uma porção de banana-nanica, bem verde, com as cascas; os taninos da banana (escrevi sobre os taninos na minha pagineta Vinho do Porto, semanas atrás, elementos vegetais, bastante viris, em frutos que ainda não atingiram a maturação) reagem com as enzimas do peixe e produzem um resultado de cor bem intrigante no prato pronto.

A seguir, duas receitas simplérrimas – e deliciosas. Você não gastará mais de vinte minutos para perpetrá-las, obviamente a um preço de banana.

Curiosidades

Impecável contra as cãibras
Dentre as vitaminas e os sais minerais que uma banana tem, ressaltam, generosamente, a C (15%) e o potássio (8%). Quem acompanha os torneios de tênis haverá de se lembrar que Guga, o nosso Gustavo Kuerten, a cada vez em que descansava em um intervalo de partida devorava uma gorda nanica. Eu explico a razão: no calor, no esforço e na transpiração, o atleta desperdiça um batalhão de sais minerais, particularmente o potássio. Conseqüência: as cãibras e as contrações musculares. Na Copa dos Estados Unidos, em 1994, que cobri para a Folha de S. Paulo, triste pela sucessão de cãibras que assolavam os craques da Azzurra, presenteei Vincenzo Pincolini, o seu preparador físico, com um cacho de quase 50 kg. Roberto Baggio até hoje me agradece.

Os insetozinhos inoportunos
De novo acredite se quiser, mas aqueles insetozinhos irritantes que circulam sobre a sua fruteira, na sua cozinha ou na sua sala, não se atraíram pela presença eventual de amostras de banana, de manga ou de maracujá. Não. Saiba você que comprou os tais insetozinhos ao adquirir as suas frutas. É isso mesmo. Os bichinhos incômodos colocam os seus ovos, que se transformam em larvas invisíveis, na própria planta de origem das frutas. Em sua casa, no calor e no aconchego da cozinha ou da sala, eclodem – e daí voam. Como destruí-los sem prejudicar as frutas? É elementar. Ao chegar à sua casa, basta umedecer um plano limpo com um produto adequado, ou com uma solução trivial, bem doméstica, de água mais 10% de vinagre, e acariciar as cascas.

Receitas

Tortinha de banana folhada
Ingredientes, para uma pessoa: Massa folhada – você pode comprar, já pronta, nos bons supermercados; serve, inclusive, a de pastel. 1 banana-da-terra. Açúcar. Geléia de frutas silvestres. Vinho tinto, de preferência suave.
Modo de fazer: Montar a massa folhada num retângulo de 15cm por 10cm e a espessura de 5mm. Pulverizar com açúcar peneirado. Descascar e livrar a banana dos seus fios. No sentido do seu comprimento, cortar a banana em lâminas de cerca de 3mm de espessura. Pulverizar com açúcar peneirado. Untar uma forma adequada com manteiga. Depositar o retângulo de massa folhada. Sobre a massa, encaixar as lâminas de banana. Com uma faca afiada, aparar os excessos de banana. Levar ao forno médio, pré-aquecido, por cerca de quinze minutos – ou, até que a massa tenha crescido e se dourado e a banana comece a se caramelizar. Paralelamente, numa panelinha com uma pelotinha de manteiga, aquecer duas colheradas de geléia de frutas silvestres e duas colheradas de vinho tinto. Em fogo suave, reduzir por cerca de cinco minutos. Retirar a tortinha do forno e depositar num prato elegante. Por cima, nervosamente, sem a preocupação com o desenho, espalhar a calda rubra.

Creme de banana ao néctar
Ingredientes, para uma pessoa: 1 banana-nanica, bem madura e bem limpa dos seus fios. 1 colher de sopa cheia de açúcar. 1 colher de sopa de suco de laranjas. 2 colheres de sopa de licor de cacau. Ramo de hortelã.
Modo de fazer: Num liquidificador, ou num processador, bater muito bem a banana com o açúcar, o suco de laranjas e o licor de cacau. Passar o resultado numa peneira ou num coador. Colocar na taça respectiva. Cobrir com papel-filme ou com papel-aluminizado, e guardar na geladeira, ao menos por quinze minutos. Ao servir, enfeitar, charmosamente, com a hortelã.



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