Setecidades Titulo Santo André
Lindemberg é condenado
a 98 anos e 10 meses

Assassino de Eloá Pimentel foi condenado por 12 crimes e
cumprirá a pena na Penitenciária do Tremembé, no Interior

Por Cadu Proieti, Elaine Granconato e Rafael Ribeiro
17/02/2012 | 07:00
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O homem que protagonizou o maior caso de cárcere privado do País em outubro de 2008, o ex-entregador de comida árabe Lindemberg Alves Fernandes, 25 anos, foi condenado ontem a 98 anos e dez meses de reclusão pelo assassinato da ex-namorada Eloá Cristina Pimentel, e pelos 11 crimes cometidos durante os cinco dias de confinamento no apartamento 24 da Rua 8, no Jardim Santo André.

Lindemberg terá ainda de pagar 1.320 dias de multa, conforme sentença da juíza Milena Dias. Após quatro dias de julgamento no Fórum de Santo André, que totalizaram cerca de 40 horas de trabalho, os sete jurados - seis homens e uma mulher - condenaram o acusado.

Com o plenário lotado e todos em pé, a sentença foi lida por volta das 19h30. "As circunstâncias delineadas nos autos demonstram que o réu agiu com frieza, premeditadamente, em razão de orgulho e egoísmo, sob a premissa de que Eloá não poderia, por vontade própria, terminar o relacionamento amoroso", apontou Milena Dias.

E foi além: "Os crimes tiveram enorme repercussão social e causaram grande comoção na população, estarrecida pelos dias de horror e pânico que o réu propiciou às indefesas vítimas".

Lindemberg, vestido de camiseta branca, ouviu a sentença de cabeça baixa - poucas vezes olhou para a juíza. Uma das irmãs do assassino, presente desde o primeiro dia de julgamento, saiu antes da leitura da sentença. Condenado, o ex-réu seguiu direto para a Penitenciária do Tremembé, onde está há três anos e quatro meses.

Do lado dos familiares de Eloá, o policial militar Ronickson Pimentel, irmão mais velho da vítima, que acompanhava a decisão no plenário, abraçou a mãe Ana Cristina, visivelmente emocionada. Depois, ela falaria rapidamente aos jornalistas: "A justiça foi feita, graças a Deus".

Do lado de fora do Fórum, na Praça 4º Centenário, populares festejavam com gritos de "Justiça" e "Eloá, Eloá".

As penas totalizaram 98 anos e dez meses de reclusão, porém, o Código Penal Brasileiro prevê, no máximo, 30 anos em regime fechado.

Hoje, na prática, Lindemberg cumprirá 30 anos em regime fechado. Mas a advogada de defesa deve recorrer no Tribunal de Justiça de São Paulo para tentar diminuir a pena, segundo o jurista Luiz Flávio Gomes.

"A acusação saiu satisfeita. A pena foi além da nossa expectativa. Acreditava que ele não seria condenado pela tentativa de homicídio do Atos (Antonio Valeriano, policial militar)", relatou Thiago Pinheiro, assistente de acusação e advogado do pai de Eloá, Everaldo Pereira dos Santos, preso em Alagoas.

Pinheiro creditou a condenação do réu a todas as acusações ao trabalho da promotora Daniela Hashimoto. "Foi muito boa e soube ser diferenciada. Temos que enaltecer a atuação da doutora", disse o assistente da acusação, após a condenação.

‘Sabia que Deus não ia me decepcionar'

dia 16 de fevereiro de 2012 ficará marcado para Ana Cristina Pimentel. Exatos três anos e quatro meses depois, Ana Cristina Pimentel voltará a dormir em paz. Lindemberg Alves Fernandes foi condenado a 98 anos e dez meses de prisão. E as lágrimas finalmente deram espaço para o sorriso. "Sabia que Deus não ia me decepcionar."

"Foi feita a justiça. Ele pagou pelo que fez", resumiu, emocionada. Ana Cristina e seus dois filhos, Ronickson e Everton Douglas, já apresentavam semblante diferente ontem. Tanto que ela vestia branco pela primeira vez. Após a fala da promotora Daniela Hashimoto no debate, ela esboçou um sorriso. Um sinal de positivo confirmou que estava confiante.

Por volta das 18h40, quando a notícia da condenação nos 12 crimes em que o ex-genro era acusado vazou, ela foi à janela ao lado de Douglas. Ovacionada aos gritos de "justiça", distribuiu saudações ao enorme público em frente do Fórum. "Saio com o coração tranquilo", disse, agradecendo todo o apoio que recebeu.

Mesma reação teve Andreia Rodrigues, mãe de Nayara. Se ainda não consegue perdoar Lindemberg, a quem chamou de uma "pessoa fria" pelo que viu nos quatro dias de júri, pelo menos ela espera que finalmente a filha possa ter paz após a condenação. "Espero que a Nayara agora consiga ter sua vida de volta."

Segundo ela, a menina, vendedora em uma loja da região, espera que o assunto tenha se encerrado de vez. O advogado da garota, José Nildo, diz que dificilmente ela voltará a falar do caso. "Ela teve que se mudar de casa por conta do assédio que sofria. Ela quer uma vida normal", disse.

De fato, Nayara cumpriu sua parte, ao prestar depoimento na segunda-feira, e então não compareceu mais ao fórum. Desde ontem ela aproveita folga no trabalho para curtir a praia de Ipanema, no Rio de Janeiro, ao lado de amigas. Em seu perfil nas redes sociais, a menina recebeu apoio das pessoas. "A justiça dos homens foi feita, mas a de Deus ainda está por vir. Amiga, pode dormir tranquila pelos próximos 98 anos", diz uma mensagem.

Se Lindemberg permanecerá um bom tempo atrás das grades, o próximo passo dos familiares será cobrar respostas do Estado sobre a ação da policia durante o cárcere no apartamento no Jardim Santo André. "A gente esperou primeiro a condenação dele para depois pensar no resto", disse Nildo. Tanto Ana Cristina quanto Andréia devem mover processo contra o governo paulista. Mas o valor de indenização que será pedido ainda não foi definido.

MP vai apurar conduta de advogada

A juíza Milena Dias, durante a leitura de condenação de Lindemberg Alves, requisitou ontem que o MP (Ministério Público) local apure declaração dada pela advogada de defesa, Ana Lúcia Assad, no segundo dia de julgamento. Na ocasião, a defensora disse, de forma irônica: "A senhora precisa voltar a estudar". O que foi contestado pela promotora Daniela Hashimoto. "É desacato."

Para a magistrada, na prática, pode ter ocorrido crime contra a honra. "Na presença de todas as partes e do público, a defensora do réu, de forma jocosa, irônica e desrespeitosa, aconselhou um membro do Poder Judiciário a ‘voltar a estudar'", traz trecho da sentença.

Nesse sentido, a juíza determinou a extração de cópia da decisão e remessa para o MP, a fim de eventuais "providências cabíveis".

Ao fim da leitura da decisão, Ana Lúcia não falou com a imprensa sobre o assunto. No entanto, nos autos, pediu pela anulação do julgamento - ela tem cinco dias para fazer o pedido no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Advogados consultados pela equipe do Diário informaram que "dificilmente" terá o pedido deferido. A própria promotora de acusação, Daniela Hashimoto, não acredita na anulação do júri - foram quatros dias seguidos.

Ontem, durante o debate de defesa e acusação, a advogada usou uma hora e meia para tentar minimizar os crimes cometidos pelo seu cliente. O que mais tarde não se concretizou.

Ela disse que Lindemberg ainda era apaixonado pela vítima e que não premeditou o crime. "Ele não é marginal ou um criminoso. Os senhores (jurados) são pessoas de bem, assim como ele. Peço que o enxerguem como irmão, pai dos senhores, amigo. Ele não é bandido. Confessou que atirou em Eloá. Lindemberg é apaixonado por Eloá. Foi o grande e único amor da vida dele. Tanto é que ele não recebe visita íntima porque ele não quer ter outra mulher", disse, sem convencer. Algumas pessoas da plateia não concordaram, embora a manifestação em plenário seja proibida.

Para o assistente de acusação Thiago Pinheiro, que defende o pai de Eloá preso em Alagoas, criticou o trabalho realizado por Ana Lúcia durante os quatro dias. "A autodefesa do Lindemberg foi mais importante que a defesa técnica. A postura da advogada foi agressiva demais", opinou Pinheiro.

Promotora usa até revólver para poder condenar Lindemberg

A estrela do último dia do julgamento de Lindemberg Alves Fernandes foi ela. Responsável pela condenação, a promotora Daniela Hashimoto se destacou durante a manhã, em sua fala no debate. Direta e segura, convenceu os jurados com seus métodos. Chegou a exibir um revólver calibre 32, o mesmo usado para matar Eloá Pimentel, para desmentir o depoimento dado pelo réu na quarta-feira. Sequer precisou fazer uso da réplica. "Fiquei feliz por poder dar uma resposta às famílias das vítimas dele."

Daniela está há apenas três meses em Santo André. Assumiu o caso Eloá em novembro e, desde então, sabia que nunca teria tantos holofotes em cima de seu trabalho. Por isso, ela prefere ver o simbolismo que da condenação de Lindemberg. "Foi a resposta da sociedade, do cidadão de bem, contra essa banalização da violência. Temos de resguardar a vida humana. Espero ter passado essa mensagem."

Sobre o responsável pelo maior cárcere privado já registrado no Brasil, a promotora não esconde seu repúdio desde o primeiro contato que teve com ele, justamente no plenário, na última segunda-feira. "Lindemberg se finge de coitadinho, mas não passa de um manipulador."

O relacionamento tenso com a advogado Ana Lúcia Assad, com quem discutiu algumas vezes, foi amenizado. Para ela, fez parte do calor dos debates. Apenas criticou a estratégia escolhida pela defesa. "Houve uma tentativa de responsabilizar a imprensa pelos crimes. Mas não foi isso que aconteceu. A doutora fez uso de todas as ferramentas a que tem direito."




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