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‘Mauá tem um prefeito melhor após a reclusão’, diz Atila Jacomussi, prefeito de Mauá

Mesmo solto, teve de esperar quase três meses para voltar ao cargo de prefeito de Mauá

Por Raphael Rocha
Diário do Grande ABC
16/09/2018 | 07:00
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DGABC


Atila Jacomussi (PSB) passou 37 dias preso, entre a carceragem da PF (Polícia Federal), na Capital, e o presídio em Tremembé, no Interior, acusado de receber propina em suposto esquema de desvio de dinheiro da merenda escolar.

Mesmo solto, teve de esperar quase três meses para voltar ao cargo de prefeito de Mauá. E ele assegura que esse período o fez refletir. “Mauá terá um prefeito melhor.”

Em entrevista exclusiva ao Diário, concedida na quinta-feira, um dia depois de ele retornar ao após, beneficiado por um habeas corpus do ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), o socialista ainda tentava tomar as rédeas da situação. Mais magro – não revelou quantos quilos perdeu nos quatro meses fora –, via um gabinete vazio, apenas com as bandeiras do Brasil, do Estado e de Mauá, que ele levou à janela na noite de quarta, quando assinou o termo de posse.

Atila negou todas as acusações imputadas a ele na Prato Feito e afirmou voltar de coração aberto, embora tenha dado início ao processo de demissão de todos os secretários ligados à sua vice, Alaíde Damo (MDB).

Apesar do discurso bastante religioso, o prefeito não escondeu mágoas com a família Damo, em especial com a ex-deputada Vanessa, a quem diz ter acolhido em seu momento mais difícil na vida. “Na vida você se surpreende de forma positiva ou negativa.”

Como foi aquele dia 9 de maio, quando o sr. foi preso?

Processo muito duro, difícil, fui surpreendido na minha casa. Prontamente e tendo consciência de que não estava devendo nada, abri as portas, acompanhei o trabalho dos policiais. A Polícia Federal fez um trabalho muito respeitoso, teve respeito comigo. Acompanhei todos os procedimentos com eles. Perguntaram se existia alguma quantia e eu mostrei que tinha, os R$ 85 mil (foram R$ 87 mil, segundo a PF), provenientes do meu trabalho, da pensão pós-morte ao meu filho (Iago), em torno de R$ 5.000, eu quem saco esse dinheiro e recebo os aluguéis da minha família, que dá aproximadamente R$ 8.000 por mês. Algumas vezes você guarda recurso em casa. Isso estava claramente apontado no meu Imposto de Renda. Para a polícia e na audiência de custódia, mostramos a origem do dinheiro, inclusive foi mostrado o recibo dos saques da pensão. Não foi só falar. Infelizmente, naquele momento, a Polícia Federal achou melhor decretar a prisão temporária, que, depois, se tornou preventiva. Foram 37 dias muito difíceis. Pensei bastante. A preocupação com Mauá era muito grande também. Mesmo recluso, pensei na cidade. Mauá é minha vida. Senti os problemas da cidade. Mauá requer cuidados. Mauá é como criança prematura, tem de ter cuidados intensivos a todo momento. Tem de estar em cima, trabalhar, cuidar como se fosse um bebê.

Como foi ouvir que não iria sair da prisão naquele dia?
Confio na Justiça e em Deus. Tinha certeza que no momento oportuno, de Deus, Ele iria fazer justiça e me trazer de volta. Primeiramente para os braços da minha família e dos meus amigos. Depois como prefeito da cidade. Ninguém chega a esta cadeira se não for pelo desejo de Deus. Sou prova viva de que Deus existe. Existem dois lugares que não tem como não pensar em Deus. Quando você está em uma cama de hospital e quando você está recluso. Nessas situações você só tem um amigo, que nunca vai abandonar, que não vê sua cor, sua raça, sua carência. Não voltei para fazer revanchismo, não voltei com sede de vingança. Voltei para a administrar com amor, fazer o que eu gosto, trabalhar, estar próximo do povo, ouvir as pessoas.

O que mudou no sr. o período de prisão?
Mauá tem um prefeito melhor. Para ser grande prefeito tem de gostar de gente. Se eu me considerava um prefeito humano, em 100%, hoje sou mais humano, em 110%. Hoje tenho missão atribuída, que Deus me deu. Não vim fazer vingança, ódio. Não vou administrar com rancor. Vou administrar com responsabilidade. Peço a Deus que Ele me dê a sabedoria de Salomão, a fé de Davi e a disciplina de Moisés.

O Ministério Público e a PF sustentam que o sr. recebeu propina durante mandato de deputado estadual, via transferências de seu ex-secretário de Governo...
É muito claro. Em nenhum momento a escuta tem fala minha. Não há qualquer tipo de diálogo. Nenhuma empresa citada na operação tem contrato com a administração (de Mauá) neste momento. Respeito muito a Justiça, mas tem de ser apurado. Não existia ordem de prisão para mim. Eu, convicto da minha inocência, me apresentei espontaneamente (à sede da PF, na Lapa). Quem teve acesso aos autos do processo viu que não existia ordem de prisão nenhuma.

Mas a PF cita o nome do sr. diversas vezes, ligando à esquema de corrupção. A que o sr. atribui essa relação?
Quero quer que não houve armação. O que Deus risca ninguém rabisca. Tudo isso teve um propósito. Tinha de passar por isso para me tornar um homem melhor, um marido melhor, um pai melhor e um prefeito melhor. Tinha de passar por isso. Aqueles que tripudiaram, que se beneficiaram pelo fato, não estou aqui para julgar. Se tiver de dar o outro lado da face para bater, farei isso.

Como foi para o sr. saber que seu ex-secretário, o João Gaspar, tinha em casa quase R$ 600 mil, além de ter sido flagrado em escutas com empresários?
O processo é de cunho sigiloso, estou impedido a falar a respeito do processo do João Gaspar. Até porque o departamento jurídico dele não está aqui. Mas quem sou eu para avaliar? Eu conheci o João Gaspar em 2014. O que aparece no processo aconteceu em 2011. Quem sou eu para ver se aquilo era verídico, se aconteceu ou não? Não estou aqui para julgar o João. Não vou fazer isso, não é do meu feitio. Tenho certeza de que a defesa do João apresentará as provas necessárias para inocência dele.

O sr. acreditava que sua vice, Alaíde Damo (MDB), fosse mexer tanto no governo?
Cargo de vice-prefeito é muito importante. Cargo de vice-prefeito, para mim, não é de expectativa. Para mim, a dona Alaíde nunca foi utensílio doméstico colocado em um canto da mesa. Eu sempre respeitei a dona Alaíde, porque entendi que tem de respeitar os mais velhos. Convidava ela para alguns eventos. Mas ela tem postura de ficar mais distante. Alaíde era assim até quando o Leonel (Damo, marido dela) foi prefeito por duas vezes. É o jeito dela. A Vanessa (Damo, MDB) passou por um momento muito delicado. No momento em que a Vanessa passou o pior momento dela, ela foi para a minha casa e foi no ombro da minha mulher (Andréia) que ela chorou. No momento mais difícil, quando um pai viu a filha passando por toda dificuldade, foi no meu sofá que o Leonel sentou. Quando todos viraram as costas para a Vanessa, a Andréia e o Israel (Aleixo, o Bell, seu aliado direto) falaram que a Vanessa era figura importante para a cidade, como mulher. Atendendo a um pedido da minha mulher e do Israel, trouxe a Vanessa para ser secretária de Relações Institucionais, para que colaborasse com o nosso governo. Naquele momento, olhei como amigo, não como prefeito. Em nenhum momento deixei a reconhecer a história da família Damo. Se a Alaíde entrar no gabinete, vou respeitá-la. Se a Vanessa entrar aqui, como entrou na minha casa naquele momento dizendo que havia sofrido uma agressão, vou receber da mesma forma.

O sr. se sentiu traído?
Traição talvez não seja a palavra. Na vida você se surpreende de forma positiva ou negativa. Jesus morreu na cruz. O filho de Deus e morreu por todos nós, e viu um de seus apóstolos não seguir sua palavra e lhe entregar à cruz para os romanos. Imagine eu. Tenho de estar preparado para tudo.

O sr. sentiu falta de contato de Alaíde ou de Vanessa?
Estava suspenso para qualquer contato político. Mas eu sou um ser humano. Aqui dentro tem alma e coração, tem vida e sentimento. A Alaíde não precisaria falar como prefeita, nem a Vanessa como secretária. Recebi o Leonel e a Vanessa como ser humano, não como prefeito. Meu pai (Admir Jacomussi, PRP) foi líder do Leonel, secretário de Obras dele. Falar que não conhece a família Jacomussi é a mesma coisa que você falar que não conhece o arroz e feijão. Só quem tem amor no coração enxerga os leprosos. Estava ferido, com ferida. Alguns têm medo de se aproximar. Mas quem é puro de coração não tem medo de se aproximar. Não tenho medo de secar a ferida de ninguém.

Sobre o decreto de calamidade financeira, o governo interino apontou para possibilidade de deficit milionário se nada fosse feito. Esse rombo realmente existia?
Eles falaram que eu recebi a cidade com R$ 1,3 bilhão de dívida? Eles falaram que recebi do ex-prefeito Donisete Braga (Pros) quase R$ 400 milhões em dívida de curto prazo? Em nenhum momento eu decretei estado de calamidade ou denegri a imagem do Donisete. Fui eleito para resolver problemas, não para dar desculpas. É possível tudo com trabalho. É estabelecer prioridade. Minhas prioridades serão Saúde, Educação, Segurança e zeladoria.

Haverá rompimento político?
Quero contar com a dona Alaíde, ela é a vice-prefeita. Minha marca está no coração do povo, isso ninguém apaga.

O sr. acha que o cenário é pior ou melhor do que em 1º de janeiro de 2017?
Estou em um quarto escuro. Cheguei e estou acendendo as lâmpadas ainda. Vamos encontrar alguns pontos que precisam ser recuperados. Não vou julgar o modelo de administração da Alaíde. Eu sou um prefeito que gosto de trabalhar, que não tem hora. Cheguei 7h30 e vou embora 23h (na quinta, dia da entrevista). E no outro dia estarei cedo. Trabalharei no fim de semana. Alaíde continuará com espaço dela. O gabinete dela está no terceiro andar, ela pode vir trabalhar.

Como o sr. sentiu a cidade com sua figura após a prisão?
Trabalho será de reconstrução, inclusive com a confiança do eleitor. De reaproximação. Desafios que terão de ser trabalhados. Não temos medo de nada. O povo tem confiança no meu trabalho. Está estampado nas mídias sociais. A maior confirmação foi que, quando saiu o habeas corpus (permitindo seu retorno, na noite de terça), não foi um ponto isolado que soltou fogos de artifício. Governo Atila não será unanimidade. Não era unanimidade, não será unanimidade.  




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