Política Titulo 23 anos atrás
Filme repetido?

Para lideranças da região que acompanharam o
caso Collor, não há elementos para cassar Dilma

Fabio Martins
Júnior Carvalho
Do Diário do Grande ABC
06/12/2015 | 07:00
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Montagem/DGABC


Grande parte das lideranças políticas do Grande ABC que acompanharam de perto o processo de impeachment contra o presidente Fernando Collor (eleito em 1989 pelo extinto PRN, e hoje senador pelo PTB) considera que não há elementos contundentes, até o momento – como existia, à época –, para cassar o segundo mandato da atual chefe da República, Dilma Rousseff (PT). Depois de 23 anos da votação que culminou com a renúncia do então dirigente do País, a petista enfrentará trâmite semelhante de pedido no Congresso Nacional, que já criou comissão especial para analisar o caso.

Em setembro de 1992, votação esmagadora na Câmara Federal deu primeiro passo para o afastamento do chamado ‘caçador de marajás’, acusado de envolvimento em esquema de corrupção. Na ocasião, ele descartou saída do cargo. Contudo, três meses após a apreciação, em meio à queda de apoio popular e político, além de perceber que receberia também parecer desfavorável no Senado, renunciou na tentativa de engavetar o processo. Mas por 76 votos a 3 foi condenado.

No caso de Dilma, o pedido formulado por juristas baseia-se em ‘pedaladas fiscais’ e decretos presidenciais de gastos não previstos na peça orçamentária. A bancada de oposição prevê concluir o exame do impeachment até abril do ano que vem. Em sua maioria, figuras do meio político da região (prefeitos, deputados e dirigentes sindicais, na oportunidade) avaliam que são situações diferentes, mesmo diante de desgaste e instabilidade da atual presidente.

Prefeito eleito de São Bernardo na época de Collor, Walter Demarchi (1993-1996) afirmou que, até agora, não se provou nenhum crime de responsabilidade contra Dilma que seja passível de perda do posto. “Impeachment é negócio sério. Não está provado que ela roubou alguma coisa. Se a presidente cair não vai melhorar em nada (a situação do Brasil)”, ponderou. Também eleito naquele ano de 1992, o então vencedor do pleito de São Caetano, Antônio José Dall’Anese (PSDB), alegou que não vê razão suficiente para derrubar a petista. “Não sou favorável à cassação.”

Primeiro prefeito eleito pelo PT no País – em Diadema – e deputado estadual na ocasião, Gilson Menezes (PDT), acredita que o pedido atual é “tentativa de golpe”. Para o ex-petista, caso haja, de fato, impeachment será prejuízo para a democracia. “Seria retrocesso. Não estou em defesa do governo, mas defendo o mandato que venceu a eleição (do ano passado). Querer derrubá-la sem provas é golpe dos reacionários. Na época do Collor ficou comprovado que ele pagava contas (pessoais) com dinheiro público. Nesse momento, não tem nenhuma improbidade administrativa contra a Dilma.”

Atualmente deputado federal, Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT), era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC na oportunidade. Ele mobilizou a categoria às ruas para engrossar o coro de ‘Fora, Collor’. Citou que havia vontade das entidades civis, como OABs e sindicatos, pela saída do ex-governador alagoano. Segundo ele, “não existe qualquer semelhança no cenário” entre Collor e Dilma. “O ex-presidente estava sozinho, tinha partido frágil. A atual presidente não tem nenhuma denúncia contra sua idoneidade. Pedem impeachment somente por não gostarem dela.”

Ao contrário dos demais dirigentes, o governador de São Paulo no período, Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB) – correligionário do vice-presidente Michel Temer –, alegou que a presidente cometeu erros que configuram crime de responsabilidade fiscal. “O mais grave não são as ‘pedaladas’, que eles podem alegar que outros governos praticaram também, mas os decretos autorizando despesas não previstas na peça. Isso configura desrespeito ao Orçamento”, assinalou. “Não sou ingênuo a ponto de dizer que, se mudar o governo, melhora tudo. Não é isso, mas começa a melhorar”, pontuou.

Dois deputados do Grande ABC votaram a favor do afastamento

Representantes do Grande ABC na Câmara dos Deputados na época do impeachment de Fernando Collor, José Cicote (PT – morto em 2013) e José Mendes Botelho (PTB – morto envenenado em 2001) votaram a favor do afastamento do então presidente da República.

A apreciação na Câmara Federal ocorreu há 23 anos, no dia 29 de setembro de 1992. O placar foi amplamente favorável à queda do chefe da Nação: 441 avais e 38 rejeições ao impeachment. Na oportunidade, 23 deputados não participaram da votação e um se absteve.

O pedido de impedimento de Collor avalizado em plenário foi formulado pelo então presidente da ABI (Associação Brasileira de Imprensa), Barbosa Lima Sobrinho (morto em 2000), e pelo dirigente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) à época, Marcelo Lavenère, hoje com 77 anos. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, em outubro, Lavenère disse que a situação de Dilma é distinta do cenário da queda de Collor.

Hoje o Grande ABC tem bancada de dois deputados novamente. Vicentinho (PT), do partido de Dilma, afirma que o impeachment da petista é “golpe”. Alex Manente (PPS), que integra a comissão especial que avaliará a solicitação da queda, se mostra a favor do impedimento.

Governador paulista na época, Fleury relata gestão conturbada

Governador de São Paulo entre 1991 e 1994, época do impeachment do então presidente Fernando Collor, Luiz Antônio Fleury Filho (PMDB) relatou dificuldades para solucionar problemas financeiros do governo paulista naquele período. Segundo o peemedebista, a situação só foi equacionada com a entrada de Itamar Franco (morto em 2011) no poder do Planalto.

“Eu tive que negociar a dívida do Estado (com a União), que estava em torno de 32 bilhões de dólares, com cinco presidentes do Banco Central, oito ministros da Fazenda e dois presidentes da República, em meio a dois planos econômicos. Isso tudo num período de menos de quatro anos e uma inflação galopante”, contou o ex-governador ao Diário. “Quando um ministro começava a entender a situação, eu tinha que explicar para o povo. Foi muito difícil, tanto que parei obras para manter serviços existentes.”

Fleury também citou outra situação em seu governo que se tornou imbróglio por conta das instabilidades política e econômica, decorrente do impeachment: a crise do Banespa (Banco do Estado de São Paulo), extinto em meados dos anos 2000 por problemas financeiros. “O Banespa não era banco insolvente, era o quinto maior banco do Brasil. Mas a falta de solução da dívida do Estado impediu a resolução. Meu sucessor (Mário Covas, PSDB, morto em 2001) só resolveu três anos depois. Porém, só conseguiu porque contou com boa vontade do governo federal, na gestão Fernando Henrique (Cardoso, PSDB). Não tive essa boa vontade.”

População acompanhou a votação em telões nas cidades

A votação do impeachment do então presidente Fernando Collor na Câmara Federal foi acompanhada em massa por moradores do Grande ABC pelas ruas em telões fixados em grandes centros urbanos das principais cidades da região.

O PT e a CUT (Central Única dos Trabalhadores) organizaram manifestações contra Collor nos sete municípios e montaram espaços em São Bernardo e Santo André para assistir à sessão, informou a repórter do Diário à época Lígia Mostazo. Com os rostos pintados, estudantes e metalúrgicos participaram dos atos. “Na medida em que aumentava o quórum de parlamentares na Câmara, em Brasília, as pessoas aplaudiam e cantavam as marchinhas contra Collor e PC (Farias, tesoureiro da campanha), que ficaram famosas nos atos-pró-impeachment”, relata a reportagem, publicada em 30 de setembro de 1992.

Então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema (hoje do ABC), o atual deputado federal e ex-líder da bancada do PT na Câmara dos Deputados, Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho (PT), esbanjava alegria pelo resultado da votação contra o mandato de Collor. “A luta deve continuar para acabar de vez com a corrupção e brigarmos por melhores salários”, dizia o hoje parlamentar.

Na semana passada, 23 anos depois, Vicentinho classificou a decisão do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), de autorizar a abertura de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff como “golpe contra a Constituição (Federal)”. 




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