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Cambuci ajuda a manter tradição viva

No Centro de Rio Grande da Serra, cooperativa produz cachaça, geleia, licor e sorvete

Por Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
29/11/2014 | 07:00
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Rio Grande da Serra é famosa pela tranquilidade e clima de cidade pequena do interior. Além disso, também é conhecida pela produção do cambuci, fruto típico da Mata Atlântica.

É no Centro que está localizada a Cooperativa Cambucy da Serra, que produz desde 2006 deliciosos derivados do fruto, tais como geleias, sorvetes, doces, licores e a famosa cachaça. Atualmente reúne 22 pequenos produtores, que residem no Grande ABC, Santos, Sorocaba, entre outros municípios.

A presidente Maria Teresa Curvelo da Silva Santos, 52 anos, conta que o fruto já era apreciado pelo imperador Dom Pedro I. “Ele gostava muito de cambuci. Tanto que o verde da Bandeira do Brasil também foi inspirado em sua cor. Foi se perdendo na história, mas sempre teve uma tradição forte.”

“Os próprios tropeiros que desciam a serra tinham o costume de colocar o cambuci nas bebidas alcoólicas, como a aguardente, porque acreditavam que ele ajudava na conservação. Por causa do forte cheiro, também era utilizado para atrair animais de caça”, afirmou a vice-presidente Nancy Soares de Carvalho, 56.

Atualmente, as duas moradoras presidem a cooperativa e cuidam de tudo. Além disso,ambas conhecem as propriedades e história do fruto como ninguém. “Participei da fundação da cooperativa e, desde o início, só tivemos um único objetivo: a busca da identidade e da cultura do povo. Tudo isso por meio do fruto”, explicou Nancy.

Após plantar um pé de cambuci, são necessários três anos para colher os primeiros frutos. Quando chega à idade adulta, a produção é abundante, sendo que cada pé chegar a dar, em média, 200 quilos.

Os produtores que fornecem para a cooperativa têm seus frutos congelados e colocados nos tonéis de preparo. O tempo que a cachaça e o fruto ficam juntos é de dez meses e não pode passar disso.

“A própria Vigilância Sanitária não deixa o prazo ser estendido. Isso porque corre o risco de o próprio fruto apodrecer, por isso, o correto é que a garrafa seja vendida sem os cambucis dentro”, afirmou a presidente.

Além disso, todos têm outra ocupação, de forma que a produção do fruto traz complemento na renda, o que estimula o cuidado com o pé. “Sempre incentivamos as pessoas a cuidarem do seu quintal, porém, a não manter uma monocultura. É importante que o cambuci tenha outras espécies ao redor para crescer saudável. Também aconselho a colocar cascas de ovos e frutas para adubar o solo”, destacou Nancy.

Por causa do seu gosto azedo, o fruto não costuma ser consumido sozinho. Porém, a inclusão na dieta garante vitamina C, além de manter os índices de glicemia baixos, deixando a diabetes longe.

Na cooperativa, o carro-chefe é a cachaça. Segundo estimativa da presidente, média de 1.000 garrafas são vendidas a cada três meses. “Ela é mais suave que a cachaça comum e deixa um gosto incomparável de azedinho no fim”, disse Maria Teresa.

Neste ano, a cooperativa conquistou o selo de classificação fiscal para a cachaça, que permite a legalização das vendas. A bebida e os outros derivados são encontrados em feiras de Ribeirão Pires e Paranapiacaba, além de na própria sede da Cambucy da Serra.

Fundo social garante cursos para cozinheiras

Além do cambuci, no Centro de Rio Grande da Serra também é possível degustar um prato de comida pagando pouco. O cardápio é preparado por moradores e professoras do curso de formação da Padaria Artesanal do município.

Parte do Fundo Social da cidade, o espaço foi fundado em 2005 em parceria com o governo do Estado e dá formação a donas de casa, que aprendem desde a correta higienização dos alimentos até a preparação de doces e bolos. São cerca de 15 mulheres por turma, que têm acesso a seis aulas e um certificado.

A responsável por passar todo esse conhecimento é Rafaela Santos Cansi Corti, 25 anos, coordenadora do curso. Segundo ela, o principal objetivo é garantir a formação de qualidade e a independência das alunas. “Começamos com aulas de vigilância sanitária, mostrando a correta higienização dos alimentos e o armazenamento. Além disso, elas também têm aulas com o pessoal do Banco do Povo e recebem assessoria jurídica, o que é muito importante caso decidam abrir um negócio ou mesmo vender os produtos em casa”, explicou ela.

Na parte de panificação, as alunas aprendem a fazer pães e doces da Padaria Artesanal, que também são servidos em eventos da cidade. “É nessa hora que ensinamos como fazer bolos, pães e salgados. São esses produtos que vão ajudar as mulheres a ter seu próprio negócio. Também falamos de chocolates e, perto do Páscoa, ensinamos a fazer ovos”, disse Rafaela.

Além disso, ela mantém no cardápio ingredientes baratos e encontrados facilmente no município. “Temos muitas receitas com cambuci, que é nativo. Tudo isso para que esse alimento entre na rotina de cada uma das casas.”

Formada em nutrição há pouco mais de três anos, a jovem moradora da cidade gosta muito da profissão que escolheu. Ela regularmente faz cursos para se aperfeiçoar e repassar os seus conhecimentos. “Nesse meio você vê muitas pessoas que não gostam de ensinar ninguém, sabe? Muita gente que fala de receitas secretas, não sabe que essas coisas não passam para frente. Acho que o que me satisfaz é ver que cada uma dessas mulheres aprende um pouco comigo.”

Segundo Rafaela, o agradecimento vem sem que ela espere. “Um dia estava aguardando o trem quando ouvi uma das minhas alunas formadas conversando com uma amiga. Ela dizia que estava fazendo bolo e que isso ajudava muito na casa. Fui falar com ela, que me agradeceu, muito feliz. Isso não tem preço”, contou.

Moradora relembra adolescência na cidade

A coordenadora do Procon da cidade, Maria Ivone Silva Lopes Rodrigues, 50 anos, guarda recordações do Centro desde a época da adolescência. Apesar de ter nascido e morado em Santo André, ela se declara de Rio Grande da Serra de coração.

“Meus pais compraram uma chácara aqui, para vivermos tranquilamente, quando eu tinha 15 anos. Lembro que quando chegamos, não tinha nada mesmo. Eram vários lotes com chácaras e a linha férrea”, contou.

Segundo ela, o que mais a marcou durante esse período foi o nascer e o pôr do sol. “Eu lembro de que nesses momentos, os telhados até brilhavam quando chovia, porque refletia neles a luz. E o sol sempre limpo, com esse ar maravilhoso. Sem dúvida, nunca vou me esquecer disso”, afirmou.

Após o crescimento do município, ela diz que não pensa em sair de lá, principalmente agora, com o trabalho de defesa do consumidor. “Fazemos bastante serviço social de orientação com as pessoas em escolas e hospitais. Acho muito importante.”

Além disso, Maria Ivone é uma das grandes cultivadoras do cambuci. De acordo com ela, já são cerca de 20 pés, sendo que ela também integra a Cooperativa Cambucy da Serra. “O fruto é maravilhoso e chama o turismo para a nossa querida cidade.”  




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