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Duas décadas que o Brasil chora a perda de um de seus maiores ídolos

Acidente em Ímola, na Itália, em 1994, tirou de cena Ayrton Senna

Anderson Fattori
Do Diário do Grande ABC
01/05/2014 | 07:00
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Há 20 anos, as manhãs de domingo não são mais as mesmas. Um grave acidente na curva Tamburello, no circuito de Ímola, na Itália, vitimou um dos maiores ídolos do esporte nacional: o inesquecível Ayrton Senna. Naquele feriado de 1º de maio de 1994 o Brasil parou para acompanhar atônito a partida de um gênio das pistas, um piloto que a cada etapa da Fórmula 1 tinha o poder de renovar o orgulho dos brasileiros.

Eram 9h13 (de Brasília) quando a barra de direção da Williams dirigida por Senna quebrou a mais de 200 km/h, o que impediu o brasileiro de contornar a curva Tamburello e o fez chocar violentamente contra o muro. No acidente, uma das hastes da suspensão perfurou o capacete do piloto e afundou o crânio um pouco acima do supercílio direito.

Mantido vivo por aparelhos, Senna foi levado ao Hospital Maggiore, em Bolonha, mas às 13h42 sua morte foi oficialmente anunciada, dando início a comoção generalizada no Brasil e no mundo.

Senna é considerado por especialistas e ex-colegas de profissão o melhor piloto da história. Dono de três títulos mundiais – 1988, 1990 e 1991 –, brilhou em época onde o talento individual se sobrepunha à tecnologia dos carros e a audácia separava os vencedores dos perdedores.

São incontáveis as corridas em que Senna saiu do carro como herói nacional. A imagem da Bandeira Brasileira estendida pelo braço direito a cada conquista está eternizada na memória dos que tiveram a chance de acompanhar a sua trajetória. Mais do que simples vitórias, Senna conseguia proezas inimagináveis, como vencer o GP do Brasil em 1991 com apenas a primeira e a sexta marchas funcionando.

Senna era muito carismático – uma das diferenças em relação ao compatriota Nelson Piquet e o que lhe dava a preferência da torcida brasileira –, tinha personalidade forte e não escondia que detestava perder. A competitividade extrema trouxe muitos problemas de relacionamento durante a carreira. Um dos mais emblemáticos foi com o britânico Eddie Irvine, no Japão, em 1993, que era retardatário e atrapalhou o brasileiro, recebendo um soco após a prova, na área dos boxes.

Mas nada se compara à rivalidade que manteve com Alain Prost nos tempos de McLaren. Em 1989, no Japão, apesar de companheiros de equipe, bateram em corrida épica de Senna, que conseguiu retornar e ainda ganhar a prova que lhe daria o título mundial, mas acabou desclassificado por manobra irregular. Em 1990, foi a vez do brasileiro jogar o carro para cima do francês e ganhar o campeonato com o duplo abandono.

Polêmicas à parte, o que Senna construiu nem o tempo é capaz de apagar. Mesmo 20 anos após sua morte, ele continua em evidência e recebe homenagens ao redor do mundo. Seu túmulo, no Cemitério do Morumbi, em São Paulo, recebe centenas de visitantes todos os anos. Em fevereiro, o piloto foi o tema da Unidos da Tijuca, que levou o título do Carnaval do Rio de Janeiro, mostrando que o nome de Senna é eterno.

Morte de Senna enterrou sonho brasileiro na Fórmula 1

Junto com Ayrton Senna morreu a tradição do Brasil em ganhar corridas de Fórmula 1. Apesar de Rubens Barrichello e Felipe Massa se estenderem na disputa da categoria e andarem em carros do pelotão principal, não conseguiram suprir o eterno ídolo.

Barrichello, que competiu ao lado de Senna, foi o primeiro candidato a protagonista após a morte do tricampeão. Apesar de vencer 11 vezes e ser recordista em disputa de grandes prêmios, com 326 corridas, Rubinho, no máximo, conquistou dois vice-campeonatos, em 2002 e 2004, ambos pela Ferrari.

O veterano, 41 anos e hoje piloto da Stock Car, lamenta não ter conseguido resultados mais expressivos. “Nada foi mais difícil do que conviver com a falta do Ayrton quando eu não era competitivo e o brasileiro, apaixonado por F-1, estava acostumado com vitórias. Não estava querendo suprir a falta do Ayrton, mas queria dar gostinho especial para os brasileiros”, comentou ao Globoesporte.com.

Rubinho vivenciou de perto a tragédia com Senna. Dois dias antes, no treino de sexta-feira, ele próprio decolou sua Jordan e bateu na barreira de pneus, capotando e parando de cabeça para baixo. Por isso, foi hospitalizado e viu pela televisão o compatriota morrer.

“Após meu acidente, o médico Sid Watkins disse que tinha morrido por seis minutos. Com a pancada, fiquei com memória reduzida. Sei que estava na Inglaterra, assistindo à corrida e, quando ele mexeu a cabeça pensei: ‘Ele vai levantar do carro’. Infelizmente foi o último suspiro”, recordou Rubinho.

Felipe Massa também chegou perto de faturar o título mundial em 2008, pela Ferrari, quando venceu o GP do Brasil, mas perdeu o troféu na última curva, porque Lewis Hamilton ultrapassou Timo Glock e conquistou o título com o quarto lugar.

Com 33 anos, Massa é atualmente o único representante titular do Brasil na categoria e mostra admiração por Senna. “Sem dúvida, mesmo levando em conta regulamentos, carros e épocas diferentes, ele foi um piloto fantástico, não apenas nas corridas, mas especialmente nos treinos classificatórios.”

NOVA GERAÇÃO
Mesmo 20 anos após sua morte, Senna segue servindo de exemplo e inspiração para jovens pilotos. Os kartistas Olin Galli, 17 anos, e Matheus Leist, 15, são dois exemplos.

“Não cheguei a conhecê-lo. mas desde pequeno assisto vídeos, filmes e leio livros dele e sempre gostei demais. Vejo que ele era um verdadeiro campeão e sempre me emociono vendo suas corridas”, afirmou Galli, tricampeão brasileiro e campeão sul-americano de kart.

“Senna é o maior ídolo da maioria dos pilotos brasileiros, como é para mim também. Simplesmente não era apenas o melhor dentro de pista, ele tinha relação incrível com seu carro, sabendo exatamente o que fazer para se tornar o mais rápido. Dentro da pista, buscava os limites como nenhum outro. Não importava qual a dificuldade, ele estava ali para vencer”, emendou Leis, vice-campeão brasileiro, sul-americano e da Copa do Brasil.

Admiração ao talento de Ayrton Senna rompe fronteiras

Os 20 anos da morte de Ayrton Senna repercutem em várias partes do mundo. Pilotos da atualidade e de antigamente, além de dirigentes que trabalharam com o tricampeão mundial mostraram admiração e respeito pelo brasileiro.

Fernando Alonso, da Ferrari, disse que Senna foi sua inspiração. “Em meus cadernos não tinha fotos de mulheres, mas de Ayrton. Meu primeiro kart tinha as cores da McLaren dele”, contou o bicampeão mundial.
Ron Dennis, dirigente que o levou para a McLaren, também mostrou admiração pelo piloto. “Acho que é (o melhor de todos os tempos), porque foi muito bom quando esteve no planeta. Não consigo ver algo positivo pelo fato de ele ter sofrido acidente e perdido a vida”, comentou.

Presidente da Ferrari, Luca di Montezemolo revelou ontem que tentou levar Senna à escuderia. “Ele queria vir para a Ferrari e eu queria ele na equipe. Conversamos no dia 27 de abril de 1994. Ele me disse que estava admirado com a estrutura da equipe e criticava o uso excessivo de aparelhos eletrônicos nos carros, pois isso, para ele, limitava a habilidade do piloto”, comentou.

Várias homenagens estão sendo prestadas em Ímola, na Itália. Ontem foi rezada missa no autódromo e hoje será liberada a entrada de carros na pista onde, à tarde, a área no entorno da fatídica curva Tamburello será batizada como Praça Ayrton Senna. No local, foi inaugurada em 1997 estátua em bronze do piloto.

No Brasil, não há nenhum evento oficial programado. O Cemitério do Morumbi, onde está enterrado o corpo do tricampeão, deve receber visita de dezenas de pessoas, como tradicionalmente acontece.

Irmã eterniza nome Senna em instituto

Março de 1994. Ayrton Senna e a irmã Viviane conversam seriamente e decidem fazer algo em prol das crianças brasileiras. Essa foi a primeira e única vez que tocaram no assunto, já que depois de pouco mais de um mês o piloto morreu após grave acidente em Ímola, na Itália.

Viviane, porém, não desistiu do sonho do tricampeão mundial e seis meses após a tragédia fundava oficialmente o Instituto Ayrton Senna, uma das organizações nãogovernamentais mais atuantes do Brasil.

“Somos uma organização que trabalha junto com o setor público para melhorar a qualidade da Educação no Brasil, através da capacitação e gestão de professores. Estamos trabalhando com mais de 2 milhões de crianças e capacitamos 75 mil professores por ano, em 1.000 municípios de todo o Brasil”, explicou Viviane, que sempre esteve à frente do projeto.

Uma das principais admiradoras de Senna, Viviane rasga elogios ao irmão. “Como piloto, conseguiu marcas incríveis para este esporte, que fizeram dele um dos melhores de todos os tempos. Mas não acho que isso seja suficiente para explicar sua transcendência, que perdura 20 anos depois da sua morte. Além de todas as marcas, o importante é como se vence, como se alcança estes resultados. Ele fazia isso através de valores que as pessoas continuam admirando: disciplina, garra, persistência, paixão, valentia... Acho que Ayrton não pertence ao âmbito das celebridades, ele superou isso. Está numa categoria mítica que transcende tempo e espaço”, ressaltou.

Viviane é mãe de Bruno, que disputou três temporadas na Fórmula 1, de 2010 a 2012 – atualmente disputa o Mundial de Endurance –, e reviveu a aflição ao vê-lo nas pistas. “A primeira vez que me disse que queria ser piloto levei um susto, porque nunca havia mencionado o assunto desde o acidente de Ayrton. Apesar do medo e do risco, entendo ele, como meus pais entenderam Ayrton”, finalizou Viviane. 




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