Setecidades Titulo Convivência com doença
Blog faz história de idosa com Alzheimer se manter viva
Por Vanessa Oliveira
Diário do Grande ABC
01/05/2017 | 07:00
Compartilhar notícia
Celso Luiz/DGABC


Tudo começa com alguns esquecimentos, até chegar o dia em que a memória se perde vez. Assim é o Alzheimer, doença tida como demência ou perda de funções cognitivas (memória, orientação, atenção e linguagem), causada pela morte de células cerebrais. Mas a assessora de imprensa Bruna Dias, 31 anos, de Santo André. não permite que a história da avó materna morra. No blog e na página do Facebook, intitulados Vovó tem Alzheimer, ela relata, com leveza e bom humor, situações vividas com Luiza Comparini Dias, 81, que apresentou os primeiros sintomas em 2007.

“O blog surgiu em 2015, quando eu trabalhava em casa, como jornalista e ilustradora freelancer, e conseguia cuidar e ficar com ela durante todo o dia. Ela estava piorando rapidamente, e nossa família estava com dificuldades em saber lidar com tudo isso”, recorda Bruna. “Precisava encontrar uma outra maneira de enxergar as coisas para me fortalecer com isso. Como passávamos muito tempo juntas, achava algumas coisas que ela dizia ou fazia muito engraçadas ou curiosas, e então resolvi escrever nas redes sociais”, completa.

Amigos sugeriram que ela escrevesse um livro, e a jovem se voltou ao mundo virtual, cuja dimensão poderia ajudar a compartilhar experiências com tantas outras pessoas que enfrentam o problema. “Comecei a receber mensagens de pessoas de outros estados que passam pela mesma situação que a nossa, que sentiam dificuldades em encontrar informações sobre o assunto ou tinham acabado de receber o diagnóstico na família. Na internet, a maioria das histórias que encontramos é de tristeza profunda ou técnicas demais.”

Luiza está em uma fase da doença que exige cuidados 24 horas. Por isso, a família optou por colocá-la em uma clínica, também em Santo André, com condições de oferecer todo o apoio que ela precisa. “Eu a visito aos fins de semana, devido ao meu horário de trabalho. Minha mãe e minha tia se revezam diariamente em visitas no período da manhã e da tarde”, fala Bruna que sempre pergunta à avó se ela recorda o que a jovem é dela. “Ela responde: ‘não consigo me lembrar, mas sinto que eu te amo’. Isso é incrível. O Alzheimer pode afetar a memória de toda uma vida e fazê-la esquecer até dela mesma, mas o amor permanece lá, e isso a doença não pode apagar.”

Em setembro do ano passado, Bruna foi convidada para palestrar sobre o blog em Londrina, no Paraná, para um projeto sem fins lucrativos relacionado ao Alzheimer, chamado Porque Eu Me Importo.

“O amor, o carinho e o apoio que minha família e eu recebemos é fortalecedor, motivador e incrível. As pessoas se identificam e se unem por conta do blog, que é uma espécie de backup de dados que guarda a história que não irá se apagar. Devo isso para ela, eu o faço por ela.”

E a vovó sente isso. Quando esta repórter lhe perguntou o que achava da neta, a resposta veio sem demora. “Muita coisa boa”, respondeu, com sorriso cheio de gratidão.

Brasil tem cerca de 1,2 milhão de casos

Segundo a Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer), estima-se que existam no mundo hoje cerca de 35,6 milhões de pessoas com a doença – no Brasil, o número de casos é de 1,2 milhão, a maior parte ainda sem diagnóstico.

“Às vezes, é difícil identificar porque há pacientes que a família não tem muito contato”, fala a professora de Neurologia e coordenadora do Ambulatório de Distúrbios do Movimento da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), Margarete de Jesus Carvalho.

A especialista explica ser difícil identificar a origem da doença. “O que a gente sabe é que há depósitos de proteína em neurônios e, por causa disso, há perda de neurônios, principalmente, na área relacionada à memória. Agora, o que desencadeia esse depósito ainda não sabemos”, reconhece.

Quase todas as pessoas acometidas por Alzheimer são idosas. “É predominante nesse público. Pessoas com mais de 60 anos têm 5% de chance de ter a doença. Acima de 80, 20%, então, conforme vai envelhecendo, aumenta a possibilidade”, explica Margarete.

Ela ressalta, porém, a chance de pessoas mais novas desenvolverem o problema. “Existe a possibilidade com 40 ou 50 anos, mas esses casos têm cunho genético.”

Um dos sinais que requer atenção é quando a pessoa pergunta diversas vezes a mesma coisa, como se já não tivesse questionado. Foi assim com dona Luiza, cuja história foi relatada ao lado. “Os primeiros sinais foram muitos esquecimentos, o que era fora do comum. As mesmas perguntas repetidas em um curto espaço de tempo, como, por exemplo, que horas são? Minha avó sempre foi uma grande cozinheira, a melhor que conheço, e, de repente, passou a esquecer panelas no fogo, queimar a comida, deixar o fogo ligado sem nada cozinhando”, recorda a neta Bruna Dias.

O tratamento da doença é medicamentoso, e remédios são liberados pelo SUS (Sistema Único de Saúde), por meio da farmácia de Alto Custo. “Os medicamentos tentam manter a concentração da acetilcolina, um neurotransmissor. Eles inibem a degradação desse neurotransmissor”, afirma Margarete.

Rede municipal oferece atendimento

A rede pública de Saúde do Grande ABC oferece atendimento a pacientes com Alzheimer.

Em Santo André, a Prefeitura informa que a Secretaria da Saúde possui e aplica o protocolo da linhas de cuidados de demência, que inclui os quadros de Alzheimer, elaborado pelo Departamento de Assistência à Saúde e validado em 2016. Os pacientes são acompanhados pela Atenção Básica e Atenção Especializada nas áreas Geriatria e Neurologia.

“Na atenção básica da cidade, os clínicos e generalistas foram capacitados para avaliação cognitiva e realizar diagnóstico precoce para Alzheimer, por meio de questionário chamado Mini Mental, de rápida e fácil aplicação, no qual se avalia quantitativamente o estado cognitivo e funcional por testes abreviados e por escala que determinará o grau de autonomia do paciente”, explicou o governo, em nota.

Em São Bernardo, a administração municipal diz que a Secretaria de Saúde assiste, em média, a 611 pacientes com Alzheimer. Essas pessoas são atendidas por neurologistas e geriatras nas Policlínicas (Centro e Alvarenga).

Em Mauá, os atendimentos a pessoas com a doença são realizados no CER IV (Centro Integrado da Pessoa com Deficiência), na Vila Magini. Os pacientes passam com fonoaudióloga, fisioterapeuta e neurologista, sendo que no momento três pacientes vêm recebendo o tratamento de Alzhimer no local.

Ribeirão Pires informa que a assistência é feita por médico geriatra no Centro de Especialidades Médicas do município. Moradores com idade superior a 65 anos que apresentem sintomas de doenças como Alzhmeir são encaminhados das UBSs (Unidades Básicas de Saúde), pelo clínico geral, ao geriatra. Caso o especialista solicite, o paciente recebe acompanhamento psicológico no Caps 2 (Centro de Apoio Psicossocial). De janeiro a março, a geriatria atendeu a 300 pacientes, entretanto, a Prefeitura salienta que “não é possível destacar, no momento, quais foram consultados por Alzhmeir”.

As demais prefeituras não retornaram as informações solicitadas.




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;