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Redução da maioridade atingiria 11 jovens da região

Dos 272 internos apreendidos nas unidades da Fundação Casa, apenas 4% cometeram crimes hediondos

Daniel Macário
Do Diário do Grande ABC
20/01/2019 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


Defendida pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) como uma das formas para ajudar no combate à violência no País, a proposta de redução da maioridade penal de 18 para 16 anos jovens que cometeram crimes hediondos afetaria apenas 4% dos jovens internados em unidades da Fundação Casa do Grande ABC.

Levantamento obtido pelo Diário junto ao governo estadual mostra que do total de 272 internos apreendidos nos centros de atendimento socioeducativo ao adolescente na região (em Santo André, São Bernardo e Diadema), somente 11 cometeram atos infracionais que se enquadram na regra de crimes hediondos, que engloba em sua lista delitos como homicídio qualificado, latrocínio, extorsão mediante sequestro qualificado e estupro (veja lista completa ao lado).

Inclusa no programa de governo de Bolsonaro, registrado junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), a proposta de emenda à Constituição que prevê tal mudança atualmente tramita na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, sem prazo para ser apreciada.

Em seu esboço, o projeto visa alterar as regras de penalização para adolescentes que cometem crimes antes de completar 18 anos. Hoje, o artigo 228 da Constituição de 1988 e o artigo 27 do Código Penal diz que esses jovens são penalmente inimputáveis e estão sujeitos às normas da legislação especial. O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) determina que essas pessoas sejam responsabilizadas por meio de medidas socioeducativas.

Embora 84% dos brasileiros sejam favoráveis à redução, conforme pesquisa do Datafolha divulgada nesta semana, a medida tem sido bastante criticada por especialistas que alegam, de modo geral, a inconstitucionalidade da proposta. “O entendimento de juristas e também da própria OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) é de que a imputabilidade penal é cláusula pétrea, que só poderia ser modificada numa assembleia nacional e não por emenda constitucional”, explica o advogado e coordenador da Comissão da Infância e Juventude do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), Ariel de Castro Alves.

Para o professor de direito penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Marco Aurélio Florêncio, a precariedade do sistema prisional é outro fator que coloca em xeque a efetivação da proposta. Para ele, com a superlotação de presídios, jovens poderiam ser atraídos ao crime organizado, em especial pelo tráfico de drogas. “Hoje na Fundação Casa eles contam com escolas, cursos profissionalizantes, algo de que esse grupo pequeno será privado se a medida for alterada.”

O entendimento do diretor da unidade da Fundação Casa de Diadema, Marcelo Aparecido de Campos, é o de que parcela da sociedade ainda não compreende o sistema das unidades do centro de atendimento socioeducativo. “É um modelo totalmente diferente da Febem. Aqui jovens tem a oportunidade de ter acesso a tudo aquilo que lhe é garantido por lei, fazendo com que ele seja reinserido na sociedade.”

‘A Fundação Casa me deu a chance de recomeçar minha vida’

Fernando (nome fictício), 16 anos, viu sua adolescência começar atrás das grades. Atraído por colegas em ascensão devido ao tráfico de drogas, foi internado em agosto do ano passado na unidade de Diadema da Fundação Casa, após ser detido em flagrante por roubo de veículo. “Me arrependo até hoje de ter aceitado naquele dia ter saído com aqueles que se diziam meus amigos”, relembra o jovem, morador do bairro Serraria.

Às vésperas de concluir a medida socioeducativa, o adolescente diz ter aproveitado sua passagem pelo centro de atendimento para planejar o futuro. “Quero sair daqui e abrir salão de cabeleireiro pequeno para ajudar minha mãe e fazer as coisas diferentes. A Fundação me deu a chance de recomeçar minha vida.”

Estudo e disciplina. Para quem passa pela Fundação Casa, estas são regras básicas a serem seguidas diariamente. De acordo o diretor da unidade de Diadema, Marcelo Aparecido de Campos, a agenda multidisciplinar direcionada aos menores infratores visa encaixar o adolescente em ambiente com regras. “A ideia é que eles tenham responsabilidade e sejam preparados para voltar à sociedade.”

Internado há quase seis meses, o jovem Roberto (fictício), 16, diz ter visto no sistema da Fundação Casa forma de descobrir seus desejos. “Aqui vi quais eram meus sonhos. Graças ao apoio da equipe. Agora é ir à luta.” 




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