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Crise ameaça abastecimento de gás

Com a ameaça de crise no abastecimento de gás da Bolívia, indústrias brasileiras e condutores de veículos movidos ao combustível estão se precavendo

Por Leone Farias
Soraia Abreu Pedrozo
14/09/2008 | 07:01
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Com a ameaça de uma crise no abastecimento de gás natural da Bolívia, indústrias brasileiras e condutores de veículos movidos ao combustível - dois grandes grupos consumidores - já estão se precavendo e buscam alternativas em caso de falta da matéria-prima.

Na madrugada da última quinta-feira, opositores do governo de Evo Morales interromperam o fornecimento de gás de um importante campo boliviano e o Brasil ficou por mais de seis horas recebendo menos de 50% da quantidade enviada por dia.

Apesar de já normalizada a situação do abastecimento no País, na Bolívia ainda persistem os embates. Portanto, os dirigentes das diversas indústrias que dependem do gás natural para dar funcionamento à produção, começam a pensar em como atuar sem o combustível.

Para se ter uma idéia, a Comgás (Companhia de Gás de São Paulo), maior distribuidora brasileira, abastece 177 municípios no Estado de São Paulo, abrangendo a capital, Grande ABC, Campinas e a Baixada Santista. Somam ao todo, mais de 550 mil consumidores. Somente o mercado industrial, responsável por 72,6% do total de gás distribuído, é composto por 1.005 companhias.

NA REGIÃO
Grandes indústrias da região trabalham com um plano de contingência (ou seja, um 'plano b', em que podem optar rapidamente por outra matéria-prima, na falta do gás). É o caso da Rhodia, cujo contrato com a Comgás prevê, no caso de redução do consumo, suas caldeiras voltarem a operar com óleo combustível.

A adoção do óleo, entretanto, significa aumento de despesas e maior impacto ambiental. A Abrace (Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia), que representa indústrias de grande porte, estima que o GLP (gás liquefeito de petróleo), por exemplo, custe o dobro e o óleo diesel, até 50% a mais do valor.

Em Diadema, a Paranoá Indústria de Borracha vai recalibrar suas caldeiras a vapor para que sejam aquecidas com óleo diesel, caso falte gás natural. "A alternativa mais viável é o diesel, e ainda assim teremos um aumento no custo do combustível de 25%", conta Dario Marini, gerente de manutenção da empresa. Outra opção seria o GLP, mas os gastos subiriam 35%.

PEQUENOS
Enquanto grandes empresas trabalham com um plano de contingência, há pequenos e médios fabricantes da região que buscam outras opções.

É o caso da Brasóxidos, de Mauá. Fabricante de óxido de zinco (insumo utilizado por indústrias de borracha, fertilizantes e rações), a empresa consumia mensalmente 90 m³ de gás em seu processo produtivo e decidiu recentemente adotar o GLP como fonte energética.

Incertezas quanto ao fornecimento e altas no preço colaboraram para a mudança. "A Comgás aumentou em 20% só neste ano", disse o diretor, Pedro Nazari.

Como o contrato com a concessionária se encerraria no final deste ano, a Brasóxidos foi informada de que ainda perderia descontos, o que elevaria o custo em mais 50%. Dessa forma, embora o GLP atualmente seja mais caro, com os reajutes, os insumos vão se equivaler em termos de valores, observa o executivo.

Sem alternativas os taxistas voltarão a abastecer com álcool

Ao final do primeiro semestre deste ano, a Comgás (Companhia de Gás de São Paulo) atendia a 396 postos que oferecem GNV(gás natural veicular).

Com a finalidade de abastecer os veículos, os principais consumidores são os taxistas, que optam pelo combustível por ser mais barato que o álcool.

Segundo Osny Donizete, taxista de Santo André. hoje ele gasta R$16 para completar o cilindro de gás. Já para encher o tanque de seu Celta Sedan com álcool, desembolsa R$ 50. "O carro abastecido com gás não desenvolve tão bem quanto o álcool, mas seu preço oferece grande vantagem, chegando a custar entre 60% e 70% mais barato".

Já para Francisco de Oliveira, taxista da mesma cidade e proprietário de um Astra, o combustível não é vantajoso devido às inúmeras manutenções que tem feito por conta da desregulação do cilindro de gás. "Quando eu trocar o carro, não terei mais a opção à gás. Tudo o que economizo para abastecer, estou gastando para consertar a embreagem e a parte hidráulica. Somente este ano já gastei R$ 1,5 mil com consertos", desabafa.

Para os proprietários de postos revendedores, que gastaram em média R$ 1 milhão para instalar bombas de gás natural, a situação já está complicada, pois o combustível sofreu reajuste de 40% em maio. "Teremos de arcar com o prejuízo, já que leva-se anos para recuperar o investimento. Desde que houve o aumento, o movimento caiu pela metade", afirma Luiz Andrade, gerente do posto Cabeça Branca, um dos pioneiros da região a comercializar o GNV. "Já estamos investindo na ampliação das bombas de diesel para suprir o prejuízo do gás", finaliza.

Plano de contingência suportaria corte de gás da Bolívia

O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, afirmou sexta-feira que o plano de contingência elaborado pelo governo suportaria um corte no fornecimento de gás de até 30 milhões de metros cúbicos por dia. O volume é equivalente a todas as importações feitas pelo País com a Bolívia. Segundo ele, térmicas, indústrias e veículos a GNV (gás natural veicular) seriam os afetados pelo racionamento.

O abastecimento de gás boliviano foi normalizado durante a tarde de quinta-feira, depois do desligamento de uma válvula do Gasoduto Yacuíba-Rio Grande (Gasyrg), que tem capacidade para transportar 17 milhões de metros cúbicos por dia.

Especialistas e executivos, porém, acreditam que é grande o risco de novos ataques, uma vez que é difícil garantir a segurança em todos os 430 quilômetros de extensão do duto.

Lobão admitiu o risco de cortes, mas disse que é um problema pontual, reflexo "das questões sociais, políticas e internas daquele país".

"O Brasil não tem queixa da Bolívia, porque o tratado tem sido cumprido. Esta crise é um problema deles, no qual não vamos nos meter", disse o ministro em entrevista coletiva após visitar as instalações das usinas de Angra 1 e 2, em Angra dos Reis.

De acordo com o ministro, o plano de contingenciamento para o caso de interrupção no fornecimento prevê que "os 30 milhões de metros cúbicos poderiam ser cortados". "Desligaríamos térmicas, mudaríamos o combustível que abastece as indústrias e os carros poderiam usar gasolina ou álcool. Portanto, se amanhã viesse a acontecer isso, não haveria problema", disse.




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