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Grande ABC registra um suicídio a cada 5 dias
Por Fábio Munhoz
Do Diário do Grande ABC
10/06/2012 | 07:00
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A cada cinco dias, uma pessoa tira a própria vida no Grande ABC. Em 2010, foram 71 suicídios na região. Entre 2000 e 2010, dados do Ministério da Saúde revelam que 845 pessoas se suicidaram nos sete municípios. Apesar do número ser alto, as estatísticas mostram estabilidade, com leve tendência de redução nos últimos anos (veja tabelas nesta página).

Proporcionalmente, Diadema e Rio Grande da Serra registraram os maiores índices em 2010. Na primeira cidade houve 21 casos, o que equivale a 5,4 suicídios por 100 mil habitantes. Em Rio Grande foram duas ocorrências, o equivalente a 4,5 episódios a cada 100 mil habitantes. Na Capital e no Estado, a taxa é a mesma: 4,7 mortes para cada 100 mil pessoas.

Na região, jovens do sexo masculino, entre 20 e 30 anos, foram os que mais praticaram o ato. De 2000 a 2010, 215 pessoas estavam nessa faixa etária, ou um quarto do total. Dos 845 mortos, 661 (78,2%) eram homens. Especialistas ouvidos pelo Diário avaliam que o número pode ser ainda maior, já que, em alguns casos, a causa da morte não é especificada no atestado de óbito como lesão autoprovocada voluntariamente.

O psiquiatra Sérgio Baldassin, da Faculdade de Medicina do ABC, explica que parte dos casos é provocada pela falta de tratamento adequado para transtornos psiquiátricos. "Entre portadores de depressão, cerca de 15% se matam", explica. Baldassin acrescenta que pacientes impulsivos ou em início de psicose também requerem atenção especial.

Para o especialista, o grande número de jovens que tiraram a própria vida pode ser explicado pelo "descontrole de impulsos e incapacidade de lidar com frustrações afetivas". O uso de drogas também pode acelerar os distúrbios.

De acordo com o psiquiatra, conforme a idade avança, as causas tendem a mudar. "Os motivos passam a ser outros, como solidão, doenças incuráveis e dores crônicas." Sobre as diferenças nos índices das sete cidades, Baldassin avalia que não há relação direta com o nível socioeconômico.

Ao contrário da imaginação popular de que as ameaças de suicídio devem ser desconsideradas, Baldassin informa que 90% das pessoas que se mataram emitiram avisos antes de concretizar o ato. "Esse raciocíno não deve valer, já que o paciente pode efetivar o suicídio para provar que os outros estavam errados em dizer que o objetivo era apenas chamar a atenção", adverte. Para a família e amigos, o médico afirma que a preocupação deve começar quando a pessoa apresenta sinais fortes de tristeza e falta de ânimo por mais de duas semanas.

O psicólogo Hélio Deliberador, professor da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), concorda que a família jamais deve desprezar as ameaças. "Quando se fala em suicídio, geralmente é uma situação que se revela e se concretiza." Nesse caso, a orientação é para que os parentes busquem acolher e se aproximar de quem apresenta essa intenção. "É necessário buscar comunicação mais efetiva e significativa para entender a que contexto isso está ligado. Se necessário, a família deve oferecer ajuda para que a pessoa refaça seu projeto de vida e encontre novamente um sentido para a sua existência."

Deliberador aconselha que as famílias que já enfrentaram esse tipo de problema procurem ajuda psicológica. "É uma situação muito traumática, que gera aspectos de culpa e de raiva para quem viveu isso de perto."

Jornalista defende que assunto seja tratado na imprensa

Apesar de frequentes, os casos de suicídio são pouco divulgados pela imprensa. A explicação é o entendimento de que a veiculação desse tipo de informação pode estimular outras pessoas a tirar a própria vida. Colunista de O Globo, o professor de Jornalismo da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) Arthur Dapieve defende que o assunto não seja ignorado.

Em 2007, Dapieve escreveu o livro Morreu na contramão: o suicídio como notícia, que avalia a forma como o tema é tratado na mídia. "Não há estudos que provem que a divulgação dos suicídios praticados por pessoas comuns faça aumentar o número de ocorrências. Aparentemente, isso é verdadeiro em casos de celebridades", explica.

O especialista indica que os veículos deem ao suicídio o mesmo tratamento dado aos casos de acidentes, por exemplo. "Se o suicídio afeta a vida dos leitores, é informação pertinente. Se a pessoa não é conhecida e o caso não impacta no cotidiano da comunidade, não é notícia. É a mesma avaliação feita em acidentes. Não são todos noticiados."

CVV recebe cerca de 2.800 ligações diárias em todo o País

Todos os dias, cerca de 2.800 pessoas procuram o CVV (Centro de Valorização da Vida). Com quase 50 anos, o serviço serve para expor as emoções e diminuir o risco de atentados contra a própria vida. "Quando alguém liga e desabafa, a vontade que tem de acabar com tudo diminui", diz a voluntária Adriana Rizzo.

Na avaliação de Adriana, o serviço apresenta eficácia pelo fato do usuário poder se expressar sem ser julgado. "Tem gente que não lida bem com críticas e, por isso, acaba se fechando." Segundo a voluntária, além de pessoas tristes, o CVV também é procurado por quem passou por momentos alegres, mas não tem com quem dividir a novidade. "Às vezes é preciso colocar para fora também as coisas boas para que não se sinta solidão."

Parte das ligações recebidas são trotes, que também são ouvidos com atenção. "Muitas vezes, ligam para a gente com uma brincadeira. Mas aí começamos a escutar e vemos que a pessoa realmente queria ser ouvida, conversar."

Em caso de ameaça de suicídio, Adriana conta que os voluntários não tentam impedir, apenas escutam. "A gente só vai pedir ajuda caso haja o pedido." Para se tornar voluntário, os interessados passam por curso de três meses. Dos 70 postos, três ficam na região (veja quadro ao lado).

O capitão Vlamir Luiz Machado, chefe da seção operacional da Polícia Militar no Grande ABC, destaca que os atendentes do Copom (Centro de Operações) também estão preparados para atender ligações com ameaças de suicídio. "Não existe fórmula de atendimento, mas o policial tem treinamento para passar a mesma tranquilidade que passaria no caso de falar com uma mãe prestando socorro a uma criança engasgada."

Ao contrário do atendimento do CVV, a polícia desloca viatura ao local da ocorrência no mesmo momento em que a vítima fala com o Copom.




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