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Moradores vizinhos relatam aumento da poluição do ar

Substância preta, de material oleoso, tem sido percebida há alguns meses nos móveis e quintais

Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
16/02/2021 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


Moradores de bairros de Mauá, Santo André e da Zona Leste de São Paulo, que estão no entorno do Polo Petroquímico de Capuava, afirmam que nos últimos meses tem aumentado a poluição em virtude da atividade das indústrias que operam no local. Os munícipes relatam que, além da poeira com a qual já estão acostumados, tem surgido um tipo de material preto, partículas muito pequenas e gordurosas, que por mais que se limpe móveis e quintais, estão sempre presentes.

Incomodado com a situação, um grupo procurou no fim do ano o Cofip ABC (Comitê de Fomento Industrial do Polo do Grande ABC), entidade criada em 2015 para a interlocução das empresas com os governos e as comunidades. O fotógrafo Douglas Mendes, 45 anos, morador do Jardim Elisabete, em São Paulo, foi um dos representantes do grupo, que tem se organizado pelas redes sociais e reúne mais de 700 pessoas das três cidades. “Já houve um período de convivência melhor, onde a gente notava menos poluição, mas as coisas começaram a piorar em 2016 e nos últimos meses mais ainda”, afirmou.

A conferente Maria Eneida Chiaroni, 53, sempre morou nas imediações do polo. Atualmente, reside no Parque São Rafael, na Capital, e concorda que tudo tem sido mais difícil. “O desconforto respiratório tem sido muito frequente. Crises de rinite alérgica, uma constante sensação de ardência na garganta”, relatou a moradora.

Todas essas situações foram comunicadas em dois encontros virtuais com o Cofip. Os moradores pediram que fossem tomadas algumas medidas, como a arborização da área no entorno do polo, onde já existiu uma horta, e a colocação de tecidos com adesivos nas janelas dos imóveis, para medir a acumulação desse material diariamente. “Ninguém é contra o polo. Mas a gente quer que as empresas trabalhem com a verdade”, pontuou Mendes. Não foi agendado outro encontro para retorno das solicitações dos moradores.

O Cofip informou que tem acompanhado a situação desde que a primeira queixa sobre a fuligem foi feita, em 10 de outubro. A entidade alega que intensificou o contato com todas as empresas associadas, que reforçaram as verificações nos processos industriais, não identificando nenhuma anormalidade que possa justificar tal situação.

“A fuligem preta oleosa relatada por vários moradores não é característica de qualquer emissão das empresas associadas ao Cofip ABC”, relatou o comitê, em nota. O processo de apuração está em curso e o Cofip afirmou que sabe “da urgência que os moradores têm em ver sua rotina restabelecida” e que é solidário às suas preocupações.

A Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) informou que examina rotineiramente a região e que neste ano foram feitas 15 inspeções, a última em 11 de fevereiro, e nada de irregular foi constatado. Este ano foi aplicada uma advertência contra uma empresa por emissão de fumaça preta – material particulado – na atmosfera, proveniente do seu processo industrial, fora dos limites de propriedade. A Cetesb não informou qual foi a empresa autuada, mas afirmou que fez série de exigências técnicas, em conjunto com a advertência, que devem ser atendidas pela empresa.

Ação civil tramita há mais de dois anos

Há mais de dois anos uma ação civil pública foi instaurada pelo MP (Ministério Público) após o promotor de Justiça do Meio Ambiente de Santo André, José Luiz Saikali, pedir esclarecimentos para as empresas do polo petroquímico pelo alto índice de contaminação atmosférica na região. Estudo da USP (Universidade de São Paulo), realizado a pedido do MP andreense, constatou que havia na região nível de poluentes 17 vezes maior do que o medido pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). A ação, onde o MP pede a responsabilização das empresas, não tem prazo para ser julgada.

A professora da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) Maria Angela Zaccarelli Marino concluiu, em pesquisa realizada entre 1989 e 2004, que os moradores do entorno do polo têm incidência cinco vezes maior de adquirir doenças na tireoide.

A dona de casa Maria Silva, 56 anos, mora desde que nasceu no bairro Sônia Maria, bem perto ao polo. Aos 23 anos foi diagnosticada com hipertireoidismo e bócio, que é o aumento do volume da tireoide. As medicações a fizeram desenvolver hipotireoidismo, o funcionamento insuficiente da glândula, e diversos outros problemas de saúde associados, como alergias, depressão e dores.

Não há um exame que determine, sem dúvidas, que a sua doença tem a ver com a poluição, mas Maria aponta para o fato de que muitos vizinhos no seu entorno enfrentam o mesmo problema. “Não acredito em coincidências. Espero que os órgãos competentes cumpram o seu papel. Não quero que as empresas vão embora, quero que poluam menos”, declarou.




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