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'Cosmococa' é pó pop de Oiticica e Neville
Mauro Fernando
Do Diário do Grande ABC
08/03/2003 | 17:39
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Hélio Oiticica (1937-1980) foi um dos mais inventivos artistas plásticos brasileiros. Em 1973, ao lado do cineasta Neville D’Almeida, autor do jovial Jardim de Guerra, do despudorado A Dama do Lotação e do desnecessário Navalha na Carne, entre outros filmes, engendrou a série Cosmococa. Oiticica fotografou os desenhos de Neville com cocaína sobre imagens de figuras do mundo pop.

Esse material ganha exposição em duas etapas na Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo, batizada Momentos – Frames, Cosmococa. A abertura da mostra: 13 de março. Em caderno de anotações, Oiticica registra o dia 13 de março de 1973 como a data da criação de Cosmococa. Ainda neste semestre, a Pinacoteca do Estado, em São Paulo, recebe a montagem completa da obra, como o artista a idealizou.

Os traços de cocaína surgem na capa dos LPs War Heroes, de Jimi Hendrix, e Grapefruit, de Yoko Ono, e no rosto de Luis Buñuel impresso em capa da The New York Times Magazine. E também na foto de Marilyn Monroe colocada na capa do livro de Norman Mailer sobre ela e em Notations, publicação de John Cage. Cada tema tem um título: CC1 – Trashiscapes, CC2 – Onobject, CC3 – Maileryn, CC4 – Nocagions e CC5 – Hendrix-War.

As trilhas da droga subvertem a imagem das personalidades. Na época em que Cosmococa foi concebida, a cocaína não era associada ao poder econômico, nem os traficantes exibiam a força que atualmente demonstram – ela ainda mantinha laços com a contracultura. Para o artista plástico, a cocaína representava uma oposição à postura capitalista. Daí o teor transgressivo da obra, que pode ser lida também como uma discussão sobre ética e estética.

Completa, conforme Oiticica imaginou, Cosmococa compõe-se da projeção dos 163 slides em paredes, com ordem pré-determinada e sonoplastia específica. Redes para deitar, colchões, almofadas e piso coberto com areia também a formam. A idéia é favorecer a integração do espectador com a obra, tirá-lo de uma conduta passiva.

A arte experimental de Oiticica rendeu reputação internacional. Mostras na White Chapell Gallery (Londres), em 1969, e no Museu de Arte Moderna de Nova York, em 1970, catapultaram sua carreira. Graças a uma bolsa da Fundação Guggenheim, passou sete anos em Nova York, onde concebeu Cosmococa. As primeiras exposições de Cosmococa tiveram espaço em Roterdã, Paris e Barcelona, em 1992.

Criador dos parangolés (capas dançáveis), Oiticica vendeu poucas obras em vida – não foi um artista voltado ao mercado. Já que faltava dinheiro para realizar as obras, Oiticica deixou anotações, manuscritas e datilografadas, em que dá instruções minuciosas sobre como executá-las.

Oriundo do concretismo, o artista logo partiu para experiências multisensoriais e foi uma espécie de precursor do que hoje se chama de instalação. Uma de suas obras, Tropicália, forneceu o nome ao movimento liderado por Caetano Veloso, Gilberto Gil e Tom Zé.

Momentos – Frames, Cosmococa – Exposição. Imagens de Hélio Oiticica e de Neville D‘Almeida. Primeira etapa: de 13 de março a 17 de abril. Segunda etapa: de 25 de abril a 17 de maio. Terça a sexta, das 10h às 19h, e sábado, das 10h às 17h. Na Galeria Fortes Vilaça – r. Fradique Coutinho, 1.500, São Paulo. Tel.: 3032-7066. Entrada franca.




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