Economia Titulo Emprego
Haitiano tem chance de reconstruir vida na região

Depois de enfrentar pobreza e falta de emprego na
terra natal, imigrante é contratado em Ribeirão Pires

Por Pedro Souza
do Diário do Grande ABC
26/05/2014 | 07:07
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Marina Brandão/DGABC


Há aproximadamente seis meses, o mecânico haitiano Maxi Guerrier, 34 anos, desembarcou no Brasil. Seu objetivo é simples: trabalhar e enviar dinheiro para a filha, de 7 anos, que ficou em sua terra natal, Cabo Haitiano. Nesta semana ele não parou de sorrir. Conseguiu o contrato de ajudante de produção na empresa de Ribeirão Pires Heatmec.

Maxi é um dos 21 mil haitianos que entraram no Brasil legalmente, entre 2010 – quando terremoto matou mais de 300 mil pessoas no país – e 2013. A catástrofe é sentida no mercado de trabalho de lá até hoje. O emprego é escasso. A economia não movimenta. E muitos, para saírem da zona da miséria, tentam a vida em território estrangeiro.

Maxi gosta muito da profissão de mecânico. Fez o curso em seu país. Mas não estava satisfeito com o salário que conseguia, cerca de R$ 650 mensais. Em 2008, ele resolveu desbravar as fronteiras e buscou trabalho na República Dominicana.

“Naquela época era muito difícil no meu país. Não tinha estabilidade econômica. Nem estabilidade política. Eu venho para trabalhar. Isso é que eu preciso, trabalhar”, explica Guerrier, como fator decisivo para sua mudança.

Com mais experiência, e estimulado pelos comentários de amigos de que a remuneração no Brasil era melhor, veio para São Paulo. Mora de aluguel na Rua da Mooca, na Capital, dividindo a residência com mais dois companheiros haitianos. Eles dividem um aluguel de R$ 600. Agora, todos trabalham.

Guerrier vai receber na Heatmec, aproximadamente, R$ 1.300. Atuará em função bem parecida com a sua preferência. Mas deixou claro que não há limites. “Gosto de ser mecânico. Mas se me mudei para cá, não tenho problema. Trabalho em qualquer coisa. O importante é trabalhar.”

Esse objetivo é tão claro para Guerrier que até agora não teve tempo para se divertir. “Se eu não estou procurando trabalho, eu estou trabalhando. Não conheço nada ainda em São Paulo.”

Ele fará parte de grupo de 12 haitianos que o sócio-proprietário da Heatmec Alberto Cavalini acrescentará em seu quadro de funcionários. Por enquanto, o empresário buscou mão de obra apenas na Capital, mas até o fim do mês, pretende realizar processo seletivo com haitianos que residem na favela dos Ciganos, no bairro Utinga, em Santo André. O local reúne cerca de 650 pessoas daquele país.

Tanto para Guerrier, que já tem domínio parcial da língua nativa do Brasil, quanto para Wislet Fleuranssaintt, 22 anos, não falar fluente o português é barreira na hora de tentar emprego no País. O imigrante mais novo está há nove meses em terras canarinhas, mas até agora desempregado.

Ele conta com o auxílio financeiro da família, que ficou em Gonaïves, no Haiti. Não tem filhos, ainda lhe restam três anos para completar o que no Brasil seria o mesmo que o Ensino Médio, mas decidiu que sua vida deveria ser diferente. “Falei que ia mudar e mudei”, conta.

Por enquanto, conseguiu participar de cinco processos seletivos em empresas da Grande São Paulo. Ouviu dos recrutadores que as companhias gostariam muito de ajudá-lo. Mas até agora não teve a oportunidade de começar, tanto pela dificuldade que enfrenta para aprender a nova língua – ele é fluente em francês e crioulo haitiano – como pela falta de experiência profissional.

Fleuranssaintt lembra que o emprego em sua terra natal é praticamente inexistente. Além dos estudos, ele praticava corrida. “Todos os dias de manhã eu corria. Uma distância como do Centro de São Paulo até a Barra Funda”, calcula. Agora, ele também aguarda o resultado do processo seletivo que realizou na empresa Heatmec. “Quero trabalhar logo para ajudar meus familiares e, quem sabe, um dia voltar para lá.”

Emprego desaparece após terremoto

Por causa de um intermediador, o auxiliar de enfermagem haitiano Gabriel Felix, 27 anos, perdeu a chance de trabalhar em duas empresas no Brasil. Ele foi indicado para um cargo em companhia de Campinas, teve a carteira assinada previamente, e quando chegou no local, escutou a frase mais temida: “Não contratamos estrangeiros”.

Após a negativa, a empresa riscou sua carteira e anotou cancelado na página. E por isso, em outro processo seletivo, para trabalhar de frentista em posto de combustível da Capital, foi informado que sua carteira de trabalho estava suja e que ele não seria contratado por esse motivo.

Mesmo após o episódio, Felix não desistiu. “Faço qualquer trabalho. Só preciso ganhar dinheiro”, destaca o haitiano, de Porto Príncipe, local dos mais atingidos pelo terremoto de 2010.
“Perdi vários familiares. Depois do terremoto, o emprego acabou na minha cidade. Não há trabalho. Como juntei dinheiro em poupança, comprei uma passagem para o Brasil (US$ 1.413) e vim trabalhar.”

Felix recorda que atuou, por sete anos, como auxiliar de enfermagem no Haiti. E após o desastre natural, lembra que perdeu o emprego e não conseguiu mais trabalho.

Ele também participou do processo seletivo da empresa de caldeiras de Ribeirão Pires Heatmec. Com uma pasta executiva na mão, que guardava seus documentos pessoais e dicionários, Felix, sorridente, não tinha vergonha de arriscar todas as palavras em português que conhecia. Segundo a encarregada de RH da companhia, Regina Oliveira Silva, ele apresentou o melhor perfil para as vagas.

Felix deixou no Haiti a mulher e dois filhos, um de 8 anos e outro de 4. Atualmente mora no bairro Cambuci, na Capital, dividindo aluguel de R$ 600 com mais dois rapazes haitianos, mas não se importa de mudar para o Grande ABC para ficar mais próximo da empresa, caso seja contratado. Principalmente porque pretende pagar aluguel sozinho. “Isso quando eu conseguir juntar dinheiro para trazer a minha esposa e meus filhos para cá”, explica, com sorriso no rosto. 




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