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Bandas independentes brasileiras buscam terreno fora do País
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24/10/2017 | 08:30
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Eram poucos shows no Brasil, seis em Goiânia, onde a banda nasceu, alguns outros por São Paulo, e logo os passaportes já estavam emitidos, carimbados e fronteira cruzada. Com pouco tempo de existência, o Boogarins pisava nos Estados Unidos para a primeira turnê fora do País. E o guitarrista Benke Ferraz, três anos e três discos depois, olha para traz e reflete: "É, a gente não sabia de nada ainda, mesmo", brinca. E ri.

Caso de maior sucesso da música independente fora do País, o Boogarins é uma exceção - um grupo capaz de passar longas temporadas no estrangeiro e voltar sem ter gasto todas as economias -, mas não a única banda nacional a se aventurar além das fronteiras, para experimentar novos públicos, entender o funcionamento do mercado estrangeiro e quem sabe, se divertir.

Toda a trajetória dos Boogarins é daquelas a colorir os sonhos psicodélicos dos mais indies: um projeto iniciado por Benke e Dinho Almeida (voz e guitarra), gravado no quarto do primeiro, cujas canções, ainda cruas, foram enviadas para selos e blogs norte-americanos. E, de repente, uma resposta: a gravadora Other Music gostaria de assinar com os guris. A banda foi montada, com a adição de Raphael Vaz, no baixo e Hans Castro, nas baquetas e seguiu, ainda verde, para fora do País com o suporte financeiro da gravadora, mas nada que pagasse, integralmente, o combo de passagens, hospedagem e transporte durante a estada fora.

"Cada banda deve ser o que é melhor para ela e qual é seu interesse ao ir para fora", aponta Benke. O Boogarins fez shows sem receber cachê, tocou por US$ 100 - "o que não é suficiente para cobrir nenhum dos gastos que tínhamos" -, mas hoje faz turnês longas por Estados Unidos e Europa de quatro a seis meses. Os dois últimos discos deles, Manual (de 2015), e Lá Vem a Morte (deste ano), foram registrados na Espanha, e em Austin, no Estado norte-americano do Texas, respectivamente, durante essas excursões, e ganharam críticas elogiosas de veículos do exterior, como The New York Times e The Guardian.

Diferentemente do Cansei de Ser Sexy, a última banda brasileira a sacudir as cabeças dos gringos e até adaptou seu nome para a sigla CSS e ser pronunciável no exterior, o Boogarins não abriu concessões estéticas e - inclusive, mantém o português nos versos de suas composições e provou que há mercado para isso fora daqui.

Não é à toa que hoje o Brasil tem a segunda maior delegação a embarcar para o South By Southwest, festival costumeiramente realizado em março e transforma Austin, por dez dias, da meca da música alternativa do mundo - a quantidade de artistas brasileiros a se apresentar por lá só é menor do que a de britânicos. A importância do País é tamanha para o festival que até foi criado o cargo ocupado atualmente por Tracy Mann para estabelecer e desenvolver os laços entre a música brasileira e o festival. "Entendo que existe falta de lugares para tocar no Brasil, por isso a necessidade de experimentar novos mercados", avalia ainda Tracy.

Mais do que aproveitar a apresentação em um festival como SXSW para criar público, o caminho a seguir é criar, ali, oportunidades de conhecer agentes de mercado e empresários estrangeiros, já que o festival atrai "olheiros" e os estrangeiros, atualmente, estão de olho no material produzido por aqui. Bruno Montalvão, agente artístico e dono da Brain Productions, especializada em levar artistas nacionais ao exterior, vê a viagem como um investimento de médio prazo. "É lógico que é um passo difícil de dar e não vai dar um retorno imediato. Isso só vai acontecer lá pela terceira turnê", explica ele, responsável por viabilizar, recentemente, a ida do duo The Baggios, de Aracaju, ao Canadá (no festival Pop Montreal) e aos Estados Unidos.

"É interessante sair da zona do conforto. Começar tudo de novo", diz Julio Andrade, o vocalista e guitarrista da dupla de rock explosivo. "Mas foi importante fazer contas, ver se valeria a pena. Com o dinheiro, poderíamos estar gravando um novo disco", explica o músico, que optou por viajar. E voltam em novembro para a cerimônia de premiação do Grammy Latino, na qual o disco Brutown, do duo, foi indicado como melhor álbum de rock ou música alternativa. Para Montalvão, embora seja importante ser cuidadoso, os Estados Unidos são um mercado a ser explorado atualmente pelas bandas brasileiras. "Estabelecendo-se lá, abrem-se as portas para tocar em outros lugares do mundo."

O mesmo, na opinião de Fernando Dotta, músico e cofundador do selo Balaclava Records, funciona para o Primavera Sound, outro festival queridinho dos brasileiros, desta vez realizado em Barcelona, na Espanha. Assim como o SXSW, o Primavera não paga cachê, mas usa do discurso de que a presença no cartaz do festival atrairá a tenção de casas de shows e empresários europeus. Em 2014, por exemplo, Dotta e sua banda Single Parents focam escalados e "cinco minutos depois do anúncio chegou um e-mail nos chamando para tocar em Portugal", ele explica. "Isso é muito comum. E, nessa turnê fora do festival, eles pagam os cachês."

E não são todas as bandas que investem pesado na carreira internacional, mas ela acontece. O Terno, de São Paulo, passou por Nova York em agosto e, agora nos dias 26 e 28 de outubro, se apresentam em Lisboa (Portugal) e Colônia (Alemanha), respectivamente. "Mas é algo pontual", aponta Tim Bernardes. Para Ricardo Rodrigues, empresário da banda Liniker e os Caramelows, prestes a embarcar na quinta turnê em dois anos de grupo, o mercado internacional já representa um terço do potencial de renda de uma banda, se tudo for bem organizado. "Hoje é essencial", ele afirma.

O Boogarins, por exemplo, agora tem empresário no exterior, não tem mais vínculo com a gravadora e opera no azul quando viaja ao exterior. "É perrengue, sim", garante Benke. "Mas é um perrengue bom."

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.




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