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Apesar de esforço, gestões esbarram em negativa de moradores de rua

Santo André e São Bernardo têm dificuldades em
reinserir moradores de rua no mercado de trabalho

Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
17/07/2017 | 07:56
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Denis Maciel/DGABC


Neste ano, as prefeituras de Santo André e São Bernardo lançaram programas em parceria com empresas para disponibilizar vagas de emprego a moradores de rua. Porém, apesar do esforço do poder público em ajudar, a dificuldade é justamente vencer a resistência desta população sem-teto a serviços oferecidos pelas administrações. 

Em Santo André, o programa Novo Começo realizou parceria com a Conexão Varejo, por meio da qual nove pessoas foram empregadas. Conforme o secretário de Cidadania e Assistência Social, Marcelo Delsir, dentro do projeto foram feitos 107 encaminhamentos. “Estimamos, já que alguns não dão retorno, que tenha média de 30% de adesão. Por meio do Creas (Centro de Referência Especial da Assistência Social), no Centro Pop, também há trabalho de elaboração de currículos e de contato com empregadores”, explicou.

“O programa voltado para este público tem sido um desafio para nós. É preciso que as pessoas queiram aceitar nossa ajuda”, admitiu o prefeito Paulo Serra (PSDB).

A gestão andreense estima que hoje a cidade tenha 520 pessoas em situação de rua, sendo que em abril 108 delas foram atendidas. “Apostamos na capacitação das equipes para abordagem e também na ampliação do quadro de psicólogos. Muitos não querem aceitar por causa das regras. Por isso a gente quer mudar o desenho do trabalho, com psicólogos e assistentes sociais, e trazê-los para dentro”, acrescentou Delsir. O secretário se refere à mudança do Centro Pop, conhecido como Casa Amarela, da região central. O intuito é oferecer local que reúna serviços de Saúde e de Educação, entre outros, mas ainda não há definição sobre o assunto.

Em relação a São Bernardo, a administração lançou o programa Emprego Cidadão. Foram contempladas 20 pessoas, contratadas pela empresa Guima Conseco, prestadora de serviços de limpeza na construção e no comércio. A cidade possui 496 pessoas em vulnerabilidade social, em abrigos, entidades, albergues e ruas.

Conforme a diretora do departamento de políticas de assistência social, Eunice de Cássia Santos Pereira, a assistência aos trabalhadores é contínua. “Temos relação próxima com um profissional de dentro da empresa que acompanha os casos”, garantiu.

Em junho, 150 pessoas foram orientadas pela Pasta a buscar vagas de emprego no CTR (Centro de Trabalho e Renda). Do total, 30 retornaram com a devolutiva que aguardam oportunidade de vaga. A cidade mantém moradia provisória, com atualmente 22 pessoas que aceitaram ajuda e estão no caminho para a ressocialização. “Você precisa estabelecer vínculo do morador de rua com quem o aborda. O primeiro passo é a conquista, e isso inclui não forçar que ele aceite a nossa proposta, mas sensibilizá-lo”, afirmou Eunice. 

O professor de Ciências Sociais da UFABC (Universidade Federal do ABC) Diego Sanches Corrêa ressaltou que a vaga deve estar vinculada a outras ações. “Não é somente isso que garantirá a reinserção na sociedade, então, não pode vir desvinculado da assistência. O fato de, inclusive no inverno, alguns recusarem albergues é significativo. As prefeituras devem levar isso em conta para oferecer condições mais adequadas.”

Mauá afirma estudar parcerias para projeto

Questionadas sobre a implantação de programas de vagas de emprego à população de rua, somente Mauá, entre as demais cidades da região, informou estudar parcerias para inclusão por meio do Fundo Social de Solidariedade. Mas admite que ainda não há prazo para a implantação. O município conta atualmente com um abrigo e um Centro Pop para atendimento à população de rua.

São Caetano afirmou que por ter uma linha férrea em sua extensão territorial recebe em média 75 pessoas em situação de rua. Há duas unidades para o abrigamento.

Em relação à inserção no mercado de trabalho, “sempre que possível, (de acordo com a condição física e psíquica da pessoa em situação de rua), temos encaminhado para o cadastro central de empregos municipal situada no Atende Fácil”, informou, em nota.

Em Ribeirão Pires, os sem-teto recebem apoio, acompanhamento especializado e oportunidade de aprender uma profissão na Casa da Acolhida, conveniada à Prefeitura. A média de atendimentos mensais é de 50 pessoas. 

As demais gestões não retornaram os questionamentos do Diário sobre o assunto até o fechamento desta edição.

População carente sofre para restabelecer vínculos

O professor de Ciências Sociais da UFABC (Universidade Federal do ABC) Diego Sanches Corrêa explica que alguns dos principais problemas para a reinserção de moradores de rua na sociedade é a descrença ou a falta de esperança. Por isso, segundo o especialista, o caminho é restabelecer todos os vínculos.

 “Para a pessoa em situação de rua, muitas vezes, o emprego é o menor dos problemas dela. Tem o álcool e as drogas, além da ausência de vínculos com familiares. Muitas vezes, eles sofreram uma série de violações de direitos. Por isso, o atendimento precisa ser multidimensional, com acompanhamento que lida com diversos problemas”, afirmou. 

Maurício Aparecido, 50 anos, nasceu em Rio Grande da Serra, mas já passou por todas as cidades do Grande ABC. Ele mora nas ruas há uma década, desde que brigou com a irmã e o sobrinho. Não é casado nem tem filhos.

 “Machuquei meu braço porque cai. Então, vou esperar a van (serviço do consultório de rua) passar. Aqui em Santo André já me ofereceram encaminhamento para emprego, mas não quero frequentar a Casa Amarela porque arrumei briga com um pessoal e não quero encontrar ninguém”, contou ele, nas proximidades de viaduto ao lado da Estação Santo André.

Ele já trabalhou de operário, mas afirma não saber ler nem escrever. Apesar disso, mantém esperança de recomeçar a vida. “Tenho sonho de arrumar outro emprego e ajudar a tirar o pessoal da rua”, afirmou Maurício, que pretendia ir para São Bernardo.

Já Leonardo Tobar, 54, conhecido como Popeye, não tem muitas esperanças de nova vida. “Era pedreiro, mas quem vai me dar um emprego já nessa idade? Enquanto isso, vou vivendo como dá”, disse. O idoso, que têm tosse forte, afirmou não aceitar ajuda da Prefeitura. “Tenho meu cigarro e minha cachaça. Na Casa Amarela não me deixam entrar (com os vícios), além de ter muita gente junta. Prefiro ficar aqui no meu canto, sossegado.”




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