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Sim, eles vivem de arte
Cristie Buchdid
Do Diário do Grande ABC
03/10/2010 | 07:22
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Eles são unânimes em afirmar que não é fácil viver de arte em um País sem tradição no consumo de cultura. Conseguiram, no entanto, transformar o que era sonho em fonte de renda utilizando matérias-primas que vão além de tintas e talento. Para vencer no mercado como artista plástico é preciso ter bons conhecimentos de marketing, além de produzir em quantidade e com qualidade. Projeção internacional também ajuda.

A excentricidade e a visão romântica comuns em biografias de grandes mestres da pintura são páginas viradas na história. No século 21, a rotina do artista plástico profissional não reserva espaço para associar pintura a hobby. "É preciso ter o mesmo rigor e dedicação de outras carreiras. O artista plástico brasileiro tem de saber vender seu trabalho, ser curador, marchand... Eu fico seis meses produzindo no ateliê e os outros seis, comercializando as obras", diz Moisés Patrício, 25 anos, de Santo André, que se considera privilegiado, pois logo no início de carreira consegue se manter criando telas, grafites, murais, foto e videoarte.

Para divulgar o trabalho é necessário usar diversas ferramentas. "Atendimento é fundamental. Penso primeiro na satisfação do cliente; dinheiro é consequência. Também é preciso ter assessoria de imprensa e site", diz o artista plástico especializado em pop art Lobo, que no ano passado vendeu 120 telas e deixou cargo de diretor de arte em rádio FM para atender às encomendas, principalmente do eixo Rio-São Paulo.

DECORAÇÃO

Para sobreviver à baixa demanda por telas e esculturas no Grande ABC, alguns artistas projetam seus trabalhos no mercado de decoração, que está em alta por causa do aquecimento da construção civil. É o caso de Renato Brancatelli, de São Caetano, que não vê problema no rótulo arte-decorativa: "A obra pode ter mensagem inserida no contexto ou conteúdo político; mesmo assim, toda pintura acaba sendo destinada à decoração de algum ambiente".

Trabalhar sob encomenda de arquitetos e designers de interiores é solução para ganhar dinheiro. "Profissionais de decoração nos sustentam, à medida que projetam colocar pinturas nos ambientes. O trabalho encomendado não é menos criativo. Encomendas remetem à história da arte. No passado, reis, igreja, burgueses encomendavam", lembra Brancatelli, que desde 1987 só trabalha com arte.

MUNDO AFORA

O reconhecimento internacional contribui em dois aspectos na carreira. No Exterior, os preços praticados são maiores e há consequente valorização do artista no mercado interno. Para projetar seu nome, o andreense D.Esteves, que completa 20 anos de carreira, morou seis meses em Paris, em 2006, onde fez exposições e contatos. "Eu já vinha fazendo exposições na Europa desde 2000. Expor no Exterior é um diferencial que valoriza o trabalho junto a galerias e colecionadores, elevando o preço. O colecionador vê que o artista está investindo nas obras", diz Esteves, cujas telas custam de R$ 1.500 a R$ 8.000. "O segredo é persistir e trabalhar muito", diz ele, que já produziu 100 obras em um ano, e desde 1997 só trabalha com pintura. "O artista precisa ter apresentação profissional, catálogo de qualidade, site, fazer muitas exposições e pintar bastante para evoluir tecnicamente e criar algo original", completa Esteves.

O mercado internacional garante o reconhecimento e absorve muito bem a obra do são-caetanense Rafael Murió, que começou a vender profissionalmente há 25 anos. "No Brasil, quem compra arte para investimento é a classe alta. Classes média e baixa compram para decorar. Dos meus quadros, 65% são vendidos no Exterior. Obra que é comercializada aqui por R$ 10 mil tem o mesmo valor (praticado fora) em euros ou dólares", diz ele, que levou 15 anos para conseguir viver de arte, apesar de não ter abandonado a profissão de publicitário, "mas poderia parar, se quisesse".

Com telas que custam de R$ 3.500 a R$ 15 mil, Murió produz de 180 a 200 quadros anualmente. "Faço, em média, seis exposições individuais por ano aqui e no Exterior". Atualmente, participa do 7º Salão de Outono, no Carrousel du Louvre, em Paris. Com a segurança de um veterano, Murió deixa as dicas: "Artistas devem valorizar seus trabalhos. Governo e empresas precisam investir em cultura para criar hábito de compra na população. Galerias virtuais servem de divulgação sem custo para os artistas. Essas galerias têm levado muitos brasileiros para fora".




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