Economia Titulo Trabalho
Haitianos fazem fila em posto do MTE em Santo André

Principal solicitação é emissão da carteira
profissional; 70 comparecem por dia ao local

Daniel Macário
Especial para o Diário
10/03/2015 | 07:30
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Nario Barbosa/DGABC


A onda imigratória de haitianos, que se intensificou no começo do ano passado, após o fechamento de abrigo para os estrangeiros no Acre, tem impulsionado o número de solicitações de carteira de trabalho em diversas regiões de São Paulo, inclusive o Grande ABC. Segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, somente em 2014 aproximadamente 2.648 desses documentos foram emitidos em todo o Estado.

Em visita à unidade do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego) localizada em Santo André, o Diário constatou a presença de aproximadamente 70 haitianos na fila de atendimento para fazer a emissão da carteira profissional. De acordo com profissionais da unidade, a frequência de trabalhadores estrangeiros que vão até o local realizar o procedimento tem sido diária. Uma funcionária, que não quis se identificar, declarou que desde o início de janeiro “virou rotina ter fila de haitianos” buscando o serviço. Questionada, a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo confirmou que essa é a média diária de atendimento no local. E que nem todos são do Grande ABC, boa parte vem da Capital para tirar o documento. 

Entretanto, apesar de o serviço estar sendo prestado desde o ano passado, é possível ainda encontrar bastante dificuldade no atendimento desse público. Isso porque a unidade não conta com profissionais que falem fluentemente pelo menos um dos idiomas dos haitianos: crioulo, francês, espanhol e inglês, sendo as duas primeiras as principais línguas.

Durante a visita, o que se notou foi um quadro de funcionários esforçado para tentar se comunicar por meio de mímica e gestos. Segundo colaboradores da unidade, o local possui um funcionário que fala francês, entretanto, quase todos os haitianos que comparecem ao local só falam crioulo, língua considerada por eles de difícil compreensão. “Ficamos esperando horas na fila com o sol quente e sem informação. Se é brasileiro eles colocam para esperar dentro (da unidade)”, relata o haitiano Leorges Matrus.

Para agilizar o atendimento, funcionários da unidade de Santo André relataram o aumento no efetivo de funcionários no setor de emissão de carteira de trabalho. Entretanto, a superintendência regional não levantou os dados referentes ao Grande ABC nem comentou que soluções poderiam ser tomadas para ofertar melhor serviço aos haitianos.

CONTRATAÇÃO - Os primeiros haitianos que chegaram na região desembarcaram por aqui em 2011, um ano após terremoto ter devastado o país caribenho. A maioria conseguiu visto para permanecer legalmente no Brasil e, atualmente, entre 600 e 800 imigrantes vivem no bairro Utinga, em Santo André – que se tornou o maior reduto de haitianos que deixaram suas famílias e estão tentando vida melhor no País.

Desses imigrantes, 244 já preencheram cadastro na Prefeitura de Santo André, que coleta dados para um censo que tem, por objetivo, conhecer o perfil e as demandas dessa população. Do total já cadastrado, a maioria é do sexo masculino (193), com idade média de 32 anos, 52% têm Ensino Fundamental, 29% concluíram o Ensino Médio, 12% têm curso Superior e 7% não declararam o grau de escolaridade. Das necessidades manifestadas, 115 precisam de emprego, 100 querem curso de Português e 29 precisam de ambos.

Visando atender a principal demanda deles, o trabalho, muitas empresas da região têm se empenhado em encaixar esses trabalhadores em seu quadro de funcionários. Somente no Centro Público de Emprego, Trabalho e Renda do município andreense, que recebe imigrantes que fizeram o cadastro na Prefeitura, 15 haitianos já foram contratados por duas empresas que não querem ter seus nomes divulgados. O serviço montou equipe que acompanha todo o processo, a partir do momento em que um estrangeiro chega para fazer seu cadastro, até a contratação.

A Prefeitura de Santo André foi uma das que fecharam parcerias para contratar esses profissionais. Há 14 meses no Brasil, Roseline St. Louis, 32 anos, foi contratada para trabalhar na recepção da Unidade de Saúde Utinga, na Vila Metalúrgica. “Estou gostando muito de trabalhar aqui. No Haiti era enfermeira, então estou próxima de minha área. Quando melhorar a língua, quero voltar a atuar com enfermagem”, revela a profissional, que já trabalha na região há sete meses e mora junto com sua prima.

De acordo com a haitiana, além de ajudar nas rotinas diárias da unidade, seu serviço também ajuda imigrantes que estão na região. “Muitos haitianos passam aqui no médico. Ajudo com a tradução deles.”

Diretora de humanidades no município, Maria Ferreira de Souza, a Loló, explica que a Prefeitura está empenhada em melhorar as condições de vida dos imigrantes. “Com a parceria, já conseguimos vagas no mercado de trabalho e em curso de Português. Alguns que foram trabalhar em Unidades de Saúde facilitam a comunicação entre haitianos e os médicos e equipe de enfermagem.”

Outra empresa que se empenhou em ajudar a população foi o restaurante Cappelletto D’Oro. “No fim do ano passado um rapaz haitiano veio verificar se tínhamos vagas para a mulher dele. Na época havia oportunidade e decidimos fazer um teste com ela. Desde então fizemos a contratação desta pessoa e estamos satisfeitos com o serviço desempenhado durante esses quatro meses”, relata a sócia-proprietária do local Marilene Vieira de Mattos.

ABUSO - Longe de seu país, muitos haitianos acabam se tornando vítimas de empresas que exploram o trabalho escravo. Apesar de o Ministério do Trabalho investigar algumas acusações, imigrantes ainda relatam situações de exploração.

Ricardo Tulysse, 38, foi uma das vítimas. O rapaz, que era eletricista no Haiti, está no Brasil há um ano. No fim do ano passado ele se demitiu de seu emprego após ter sido forçado a fazer hora extra. “Trabalhava como manobrista na Vila Mariana. Ficava das 7h às 17h. Um dia, meu chefe disse que se não fizesse hora extra todo dia eu poderia ir embora. E eu fui.”

Ele ficou no local por dez meses e, atualmente, está desempregado, mas vive com o seguro-desemprego. “Estou buscando emprego em construções e reformas.” 




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