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Sexta-Feira, 26 de Abril de 2024

Coração santo
Dom Pedro Cipollini
20/06/2020 | 23:58
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Na expressão popular, uma pessoa sem coração é uma pessoa desalmada e ruim. Falta-lhe o essencial: o amor. O coração, como órgão fisiológico, é símbolo do amor. Este símbolo é usado e abusado na nossa cultura, tão carente de um amor verdadeiro.

Não se trata de simples metáfora. A palavra coração é usada na Bíblia, para designar a profundidade do ser como algo central na pessoa, assim como o coração anatômico está no centro do corpo. Coração designa o amor em suas múltiplas dimensões, capaz de unir, cuidar, servir, dar a vida. O amor de mãe é uma das suas expressões máximas. 

Coração é símbolo da capacidade de amar e ser amado, que dá a base primária da inalienável dignidade da pessoa.

Neste mês de junho, no calendário litúrgico da Igreja Católica, consta a solenidade do Sagrado Coração de Jesus. O Filho de Deus vem revelar-nos que “Deus é amor” (1Jo 4,16). Ele nos amou primeiro. Morreu na cruz por nós como prova de seu amor. Sabia que para falar ao vento bastam palavras, mas para falar ao coração são necessárias obras.

Assim tudo no mundo é obra do amor de Deus. Só o amor dá sentido à vida. É esse amor “que move o céu e as estrelas” como escreveu Dante, no final de sua obra monumental Divina Comédia.

Esta devoção é antiga e remonta aos santos padres da Igreja. Santo Agostinho, filósofo e teólogo, já no século IV entende “coração” como intimidade mais profunda, o centro original e fundamental do ser humano. Foi, porém, em 1765 que o papa Clemente XIII instituiu na Igreja a festa do Sagrado Coração de Jesus, a partir da experiência mística de Santa Margarida Maria Alacoque. Esta devoção, difundida no mundo todo, é seguida por milhares de fiéis católicos, através do AO (Apostolado da Oração) muito presente em nossa Diocese.

Você que leu até aqui poderá achar sentimental tudo isto, mas não é. Poderá perguntar: onde fica a razão? Por incrível que pareça foi um filósofo ‘cabeça’, matemático e inventor da máquina de calcular que nos legou esta frase: “O coração tem razões que a própria razão desconhece” (Blaise Pascal). Na verdade, tudo que o ser humano faz sem amor não tem valor realmente positivo e construtivo.

Uma grande lição para a sociedade, que passa despercebida, é que esta devoção ao coração misericordioso de Jesus convida à tolerância em uma cultura globalizada e pluralista como a nossa. Tolerância não diz respeito somente à relação entre o poder político e o credo religioso, mas deve existir em todos os segmentos da sociedade. É em última instância a aceitação amorosa e respeitosa, não só do pluralismo religioso, dentro do respeito à consciência de cada um, mas é respeito à liberdade de opinião e à democracia.

Esta atitude de respeito mútuo está atualmente sob ameaça em muitas sociedades. Neste contexto não se pode calar à força as diferenças, porque, apesar delas, existe um caminhar juntos, em busca da unidade e felicidade que estão em Deus.

Em Jesus Deus se manifesta como um Pai amoroso, capaz de perdoar e incluir a todos em seu coração. Este Coração Santo convida a atitudes de solidariedade com o outro. 

Escutando, buscando juntos, dialogando como iguais a fim de discernir a verdade e o bem comum.

Voltaire, filósofo iluminista francês, escreveu um Tratado sobre a Tolerância e legou-nos esta frase: “A tolerância é tão necessária na política como na religião, só o orgulhoso é que é intolerante”. Hoje necessitamos de humildade para construir uma sociedade que tenha coração. É aí que está a força de um povo, e não na violência.




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