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Quinta-Feira, 18 de Abril de 2024

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As ferramentas de Natalino Vertematti
Por Ademir Médici
12/12/2018 | 07:00
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O grito de socorro dado por esta página Memória, em prol da preservação das ferramentas do saudoso Natalino Vertematti (1889-1992), foi ouvido pelo professor Alexandre Takara. Memória aguarda que o grito seja ouvido também pelas nossas casas de memória.

A resposta do professor Takara ao apelo de Memória vem em três capítulos, verdadeiras aulas. Acompanhem.

I – De pedaços de madeira a uma vida
Alexandre Takara

A vida cotidiana, dos mesmos gestos, dos mesmos ritos e das mesmas regularidades, parece monótona. Não há problemas e, se houver, são de soluções previsíveis, portanto, sem criatividade. Ledo engano. E a página Memória, semana passada, demonstra o contrário, ao enfocar a construção de instrumentos de trabalho com pedaços de madeira pelo Natalino Vertematti. E a página mostra esses instrumentos, ciosamente guardados pelo filho Flávio, e indaga: qual a destinação desses equipamentos? Não há outra alternativa, se não museus. Qual deles se habilita? – provoca Ademir Medici.

Faz sentido essa provocação. Esses equipamentos transcendem o sentido de instrumentos de trabalho para ganhar as dimensões de ‘objetos biográficos’. Esses objetos, como o conceito revela, contam a história de vida de uma pessoa. Portanto, objetos revestidos de significações e envoltos de valor afetivo, mais do que valor material. Eles perpetuam a sensação de continuidade. E, por estarem carregados de afetos, torna-se difícil desfazer deles.

Não obstante, Flávio, o filho do Natalino, pretende destiná-los a um museu. Compreendo o seu empenho. Os instrumentos de trabalho, construídos por seu pai, têm significação para além da história de vida da sua família para ganhar as dimensões de história de um povo, no caso, de imigrantes italianos. Se não, vejamos.

Seus avós, italianos, mudaram para o Brasil no fim do século 19. Seu pai nasceu em 1899. Como todos os descendentes, eram pobres e não tinham dinheiro para comprar instrumentos de trabalho. Qual a alternativa? Construí-los. E Natalino aprendeu com seus pais e aperfeiçoou-os. São esses instrumentos que a página Memória publica.

Meus possíveis leitores possivelmente indaguem: por que a história de vida de Natalino Vertematti me sensibilizou?

2 – O mundo do trabalho

Respondo: por uma semelhança. Meus pais vieram para o Brasil, em 1917. Trabalharam, durante décadas, nas fazendas de café de Promissão, onde nasci. Pobres, não tinham recursos para comprar instrumentos de trabalho. Não resultou outra alternativa, se não construí-los ou recuperá-los: enxada, foice, serrote... e guardavam sucatas como pedaços de ferro, latão, tábuas de madeira, cordas, couro de animais curtido – ah! – tudo, um dia, podia ser útil!

Acontece que, em 1946, mudamos para São Paulo e, depois, Santo André, em 1950. Não pudemos trazê-los, mesmo porque, na grande cidade, não teriam serventia. Ao longo da história da família, tivemos de abandonar instrumentos de trabalho e... pedaços de nossas vidas. E, ao ler a história de vida do Natalino Vertematti, recompus parte de história da minha família e da comunidade japonesa, particularmente a okinawana.

Em 2010, a diretoria da Associação de Okinawa do Brasil de Santo André decidiu organizar uma exposição sobre o Universo Cultural de Okinawa no Museu de Santo André Dr. Octaviano Armando Gaiarsa em parceria com a Prefeitura. Aprovado o projeto, saímos em busca de material iconográfico – fotografias, objetos e documentos, tudo que contasse a história da comunidade. 

Um dos itens foi a pesquisa de instrumentos de trabalho nas fazendas. Nada ou pouco encontramos, para a decepção dos organizadores. Desse modo, a própria comunidade apagou um aspecto importantíssimo da sua história: seu modo de trabalho, bem ao contrário do que fez Natalino Vertematti. Assim, ele dá uma lição às comunidades estrangeiras radicadas no Brasil: não destruam memórias de trabalho.

A preservação da memória e da identidade das comunidades estrangeiras concentra-se mais em aspectos culturais como a música, a dança e a culinária, mas devem estender-se também ao mundo do trabalho, como fez Natalino Vertematti. Ele foi além, participou intensamente do movimento anarco/socialista.

3 – O anarco/socialista

O operário Natalino Vertematti procurava seus iguais: os anarco-socialistas. Estes desencadearam a primeira greve geral no Brasil, em 1917.

No município de São Bernardo que, no início do século 20, se estendia pelos territórios dos atuais sete municípios, a greve foi acentuada em virtude da presença de muitos trabalhadores espanhóis e italianos aqui residentes. Que objetivos procuravam os anarco/socialistas? Aumento de salários, a efetivação de direitos trabalhistas; o direito à associação dos trabalhadores, a redução da jornada de trabalho, melhores condições de trabalho e fim de exploração de menores.

Em 1917, Natalino, com 18 anos de idade, adere à greve. Ele conta, em depoimento a Ademir Medici (vide Guido Poianas –  Retratos da Cidade, livro organizado por José Armando Pereira da Silva [Fundo de Cultura do Município de Santo André, 2002, à pg. 54]), que estava ao lado do Constante Castellani, quando foi morto com tiros em frente a fábrica de Móveis Streiff, estabelecida à Rua Oliveira Lima.

E como Natalino se introduz no citado livro, se o objetivo era descrever a cidade de Santo André nas obras do Guido Poianas? Zé Armando, o autor do livro, queria homenagear a Poianas, retratista da cidade, nas vozes dos amigos e admiradores dele. Assim, Ademir Medici, que havia entrevistado Natalino Vertematti em 1992, foi designado para publicar a íntegra da entrevista de Natalino Vertematti, amigo próximo de Guido Poianas. O entrevistado conta fatos que, hoje, caíram no esquecimento. Ele fundara a Liga Operária, violentamente perseguida pela polícia por ferir a Constituição.

A obra de Zé Armando é um amplo painel de Santo André na visão de Guido Poianas, escrito por diversos autores, com enfoque na transição da economia rural para a industrial, a emergência da classe operária, o sindicalismo, movimentos culturais, a urbanização, o casario, notadamente do bairro Assunção, onde residiu – todos os textos ricamente ilustrados com as obras do artista homenageado. É nessa obra que se faz ouvir e é importante ouvir a voz de Natalino Vertamatti.

Nota da Memória – Flávio Vertematte, herdeiro de Natalino Vertematti, não conhece o livro de José Armando Pereira da Silva. Quem teria um exemplar a mais para presenteá-lo?

Interação com Facebook
 

‘Tempo de medo na casa do finado’
 

De repente, um grito pavoroso ecoa na casa onde o falecido habitou com os familiares.
Da crônica de Guido Fidelis publicada pelo Diário em 11 de dezembro de 1988. Confiram a íntegra no Facebook da Memória – acessem o endereço acima.

Diário há 30 anos

Domingo, 11 de dezembro de 1988 – ano 31, edição 6933

Política – A mulher ganhou mais espaço nas últimas eleições no Grande ABC. Dos 2.690 candidatos a vereador, 309 eram mulheres. Nove foram eleitas. Vera Severiano, do PT de São Caetano, é a mais jovem.
Natal – Shoppings do Mappin, Eldorado, ABC Center, Golden, Shoppinho, Center Shop e Duakl fazem seu primeiro Natal em conjunto, mas o comércio de rua resiste.
Movimento Sindical – Sindicato dos Motoristas do Grande ABC inaugura sua nova sede, à Rua Santo André, 435.

Em 12 de dezembro de...

1918 – A gripe espanhola: autoridades sanitárias da Capital registram mais 16 mortes.
A guerra acabou. Preparativos para a recepção do presidente Wilson na França.
A indenização que a Alemanha deverá pagar.
Ruy Barbosa se recusa a participar da representação do Brasil na Conferência da Paz.


Hoje

-Dia Internacional da Criança na Mídia, criado pela Unicef.


Município Paulista

- Hoje é o aniversario de Ibirá, criado em 12 de dezembro de 1921, quando se separa de São José do Rio Preto.


Santos do Dia

- Nossa Senhora de Guadalupe foi declarada a padroeira da América Latina em 1945 pelo papa Pio XII.
- Cury
- Maxêncio
- Vicelino




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