João de Deus não usa computador nem máquina de escrever. Suas cartas são manuscritas, não padronizadas, com histórias vividas, mensagens positivas, letra desenhada, gravuras anexadas, trechos de canções brasileiras e casos ligados ao folclore. À Memória, ele escreveu: “Vocês acreditam que ainda tem gente que escreve cartas?”.

Nós acreditamos. O jornalista Francisco Lacerda, editor da coluna Palavra do Leitor, também, já que ao longo do ano ele recebe cartas escritas por João de Deus sobre os mais variados assuntos.

Quem fez uso de uma máquina de escrever até o fim da vida para se dirigir ao Diário – e à página Memória – foi o ex-prefeito de São Caetano Raimundo da Cunha Leite. No caso de João de Deus, são manuscritos, fruto do seu aprendizado escolar na Usina Tamoio, em Araraquara, e do aperfeiçoamento no chão da fábrica, no caso a portentosa Volkswagen do Brasil, onde se aposentou, fazendo parte da pioneira comissão de fábrica.

Estivemos na casa do João de Deus. Suas cartas são abençoadas pelo presépio montado na entrada da residência. Presépio à antiga, que a cada ano ganha um componente a mais. O sistema de iluminação é lindo:

– Conte até três – sugeriu ao visitante. Ao fim da contagem, tudo se iluminou.

Aos pés do presépio, as 100 cartas que chegarão antes do Natal. Quisemos levar a nossa pessoalmente. João de Deus não deixou.

– Precisa ter o aval do Correio, para não perder a tradição. 

As mensagens começam no próprio envelope. Em todos eles, num carimbo, a mensagem de fé e incentivo ao carteiro que terá a incumbência de conduzir a correspondência. “Tudo de bom a você, companheiro carteiro.”

Sendo assim, aguardem. Logo, logo, um carteiro estará chegando à sua casa com a carta escrita, ou melhor, desenhada por este caboclo que vive no miolo do Grande ABC.

ET – Para fazer tantas cartas diferenciadas, João de Deus começa a escrever em janeiro.