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Bares, lanchonetes e igrejas dificultam a vida dos moradores de Santo André

Ao menos seis bairros vivem o problema,
que envolve drogas e barulho excessivo

Julia Alves
Especial para o Diário Online
30/03/2017 | 15:55
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Julia Alves/DGABC


Idosos, crianças, estudantes e trabalhadores têm sido privados de sossego em algumas ruas de Santo André. A causa do incômodo é provocada por bares, igrejas e lanchonetes instalados em bairros residenciais, que funcionam até a madrugada com som alto e cujos frequentadores fazem uso de drogas e estacionam carros em locais impróprios.

Em fevereiro, a Prefeitura implantou a “Operação Sono Tranquilo”, uma iniciativa conjunta com as Polícias Militar, Civil e Guarda Municipal que fiscaliza e atua no combate a delitos que perturbam o sossego dos andreenses. No entanto, a ação está longe de ser totalmente eficaz.

Na Vila Bastos, o incômodo é diário, mas piora aos fins de semana, feriados e em dias de jogo, quando o barulho vindo de dois bares localizados na Avenida Lino Jardim e na Rua Edu Chaves se estende até às 6h da manhã. Não se dorme, trabalha ou estuda, conforme conta a empresária de 57 anos que preferiu não se identificar. “É comum vermos o pessoal usando drogas nas calçadas da frente. Tenho medo de entrar e sair de casa, perdemos toda a privacidade”, conta. O medo da convivência se alastrou no bairro, com os moradores temendo a proximidade das drogas, utilizadas livremente devido à falta de fiscalização.

A vida também é conturbada na Vila Metalúrgica. De acordo com o empresário Raphael Pagnardi, 26, uma lanchonete na Rua Cartagena vem dificultando a rotina. “O problema é a música alta e o karaokê. Parece que o barulho está dentro de casa e ninguém consegue dormir. As pessoas brigam, quebram garrafas e as jogam no meio da rua”. Raphael mora no bairro há mais de nove anos. Com ele vive dona Dorvalina, sua avó de 78 anos, que também é prejudicada pelo barulho em excesso que ocorre às quintas-feiras, sextas-feiras e sábados, atravessando as madrugadas. O morador afirma que realizou diversas ligações para a polícia militar, porém o volume do som no estabelecimento é aumentado assim que os policiais vão embora.

No bairro Santa Terezinha, uma moradora que vive no local há 17 anos com dois idosos e uma criança de 4 anos preferiu não se identificar por medo de represálias, mas contou que, entre meia noite e 5h da manhã, a música é ligada no último volume em um bar localizado na Av. Eng. Olavo Alaysio de Lima, ao lado do Craisa (Companhia Regional de Abastecimento de Santo André). Apesar da proximidade de uma delegacia, na Avenida Utinga, as denúncias não são atendidas. “Ligamos para a polícia e a informação dada foi a mesma para todos, eles dizem que não tem viatura disponível para irem ao local”. Os moradores também foram ao estabelecimento pessoalmente para tentar resolver a situação, mas os donos se recusam a abaixar o som. “Ninguém é contra a diversão, mas que façam isso em horários apropriados. Aqui é um bairro antigo e é muito difícil para os idosos.”

A batalha entre quem gosta de som alto e quem deseja silêncio é antiga no bairro Bangu. Um bar localizado na Rua Pacaembu costumava causar transtornos todos os fins de semana. Porém, após uma mobilização da população há dois anos, o estabelecimento resolveu reduzir a movimentação e realizar apenas uma festa por mês. Contudo, neste dia os moradores ficam impossibilitados de dormir e de acessarem suas casas, como conta uma consultora de Recursos Humanos, que também preferiu não se identificar. “As ruas enchem de carros e não conseguimos transitar. Uma vez cheguei em casa por volta das 21h e não consegui entrar, pois uma cliente havia estacionado na frente do meu portão. O bar tem até um manobrista, que para os carros na frente das residências”, conta. Além disso, o som alto atrapalha o sono dos pais da consultora, que ouvem as músicas e conversas de clientes como se estivessem dentro do local. A consultora e sua família já tentaram por diversas vezes conversar com os donos do bar e têm feito ligações para a polícia, sem resultados. “Não sei se a polícia tem muitos chamados desse caso e tratam como uma coisa banal, mas reclamar não adianta, porque ninguém vem.”

Considerado um dos melhores e mais caros da cidade, o Bairro Jardim está longe de ser um lugar sossegado. Isso porque os moradores são vizinhos da subsede da torcida da Gaviões da Fiel e da Igreja Batista Central. O encarregado de expedição Javier Fariña, 41, conta que os gritos e as músicas da igreja instalada na Avenida Industrial são ouvidos constantemente. “O que incomoda são os ensaios e o ruído vindo do gerador de energia. Não tem acústica nenhuma e os louvores vão até tarde”, conta. Além disso, a proximidade com a sede de torcida organizada, que fica próxima a Estação Prefeito Saladino, também importuna à vizinhança. “Os dias de jogos e comemorações tem batuques, gritos e fogos de artifício. O problema é que isso ocorre em horários inapropriados. Os rojões assustam as crianças e nos impedem de dormir.” Quando os moradores de um condomínio da região se mobilizaram para fazer a denúncia, foi exigida a presença de um reclamante na delegacia. No entanto, nenhum morador quis se identificar por temer retaliações.

De acordo com os moradores do condomínio Praça Jardim, no bairro Valparaíso, os cultos da igreja localizada na Avenida Atlântica parecem parte de uma performance musical. A gerente de legalização Andrea Souza, 39, conta que os louvores se estendem até a madrugada e atrapalham as tarefas rotineiras. “Quem tem criança não consegue dormir, as pessoas não conseguem assistir TV. Moro em um andar alto e, mesmo assim, consigo ouvir o barulho. Os outros moradores querem se unir para levar o caso à Justiça, pois a situação está insustentável”. A moradora também conta que já foram feitas várias ligações para o 190, porém o caso parece não ter sido averiguado pois o volume alto persiste.

Em nota, a Prefeitura de Santo André afirmou que os focos de perturbação são definidos de acordo com denúncias recebidas nos diversos canais de atendimento aos moradores, como o portal de serviços ao cidadão (www.santoandre.sp.gov.br), bem como o 0800-0191944, além da Praça de Atendimento localizada no térreo 1 do Paço.

Moradores podem recorrer ao Ministério Público
Apesar da implantação da Operação Sono Tranquilo os moradores não têm tido suas denúncias atendidas e dizem não haver solução. No caso de falha do poder público, contudo, existem outras formas de resolver o problema da perturbação do sossego.

De acordo com o advogado especialista em direito civil e administrativo Vladimir Vitti Júnior, o som excessivo vindo desde uma conversa na rua até uma festa pode ser considerado perturbação. “E assim ocorre em bares, baladas, festas, reuniões sociais, grupos nas ruas e calçadas e até em igrejas. Além do bom senso, as pessoas e seus estabelecimentos devem manter isolamento acústico em suas estruturas ou utilizar volume suficiente para atingir seu fim sem perturbar o outro”, explica.

Além de cometer uma infração penal, o estabelecimento poderá ser punido com multas administrativas, apreensão dos instrumentos sonoros e se tornar alvo de uma ação civil, que busca proteger os interesses coletivos. Para a ação, o advogado destaca que é preciso reunir provas e testemunhas.

Caso a denúncia - que deve ser realizada à Policia Militar, Civil ou para a Guarda Municipal - não resolva o problema, as vítimas podem recorrer diretamente ao Ministério Público ou a um advogado. “O Ministério Público, como defensor da sociedade, possui promotorias especializadas que podem buscar sanções administrativas ou penais aos infratores, enquanto o advogado pode intermediar a comunicação ao MP ou propor medidas cíveis para indenização ou proibição do barulho excessivo.”




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