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Cotidiano
O fogo é fogo
Rodolfo de Souza
21/11/2018 | 20:37
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E o fogo implacável não devora só museus e barracos, devora também matas, casas e gente. Pessoas sem recursos e pessoas com dinheiro suficiente para comprar o que quiser, exceto a condescendência do fogo, que é imparcial.

A natureza é mesmo assim, não se deixa subornar nem intimidar, tampouco faz acordos escusos. Na verdade, não dá lá muita importância para a natureza humana, sobretudo aquela de pensamento vil, cujo único propósito nesta vida é a conquista desenfreada de bens materiais que o fogo facilmente consome. Talvez perseguir esse objetivo faz se sentir mais forte o ser de visão um tanto limitada e equivocada, que só consegue enxergar grana como fonte de todas as boas coisas.

Triste que, para saciar seus anseios de conquistas monetárias, o homem extrapola a ponto de abocanhar a propriedade alheia, privar o outro de uma existência digna, matá-lo, se necessário for... E não raro, chega a levar nações inteiras à ruína. Segue, pois, ateando fogo nas economias, nas matas e nos recursos que seriam suficientes para conceder ao cidadão uma vida justa. Ao cidadão de toda parte.

Mas o fogo não teme o forte e impiedoso, o destemido do velho Oeste. Na verdade, segue consumindo, uma vez que fora criado para isso: para queimar e só queimar, sem distinguir raça, credo ou poder aquisitivo. Também não se importa com os partidos de esquerda ou de direita que queimam dinheiro público e a vida inteira numa eterna e inglória queda de braço que se renova indefinidamente.

E o mundo assiste incrédulo ao cenário de insegurança e medo que a força bruta cria quando impõe sansões ao desfavorecido, simplesmente por julgá-lo mal-intencionado, malvestido, passível de oferecer ameaça à humanidade, talvez por seu corte de cabelo ou por sua barbicha nada ocidental. Mas esse poder que ora se agiganta e declara o veredicto ao réu, que nem culpado é, deixa claro como o dia que a verdadeira ameaça vem de suas mãos, que acenam sorridentes para os povos que só cruzam os braços, aqui e acolá.

Mas é preciso observar que no quintal do poder a nevasca chegou antes do previsto, que tiroteios cerceiam a vida por toda a parte. Noutro dia foi a vez do furação levar desespero, e agora é o fogo que segue seu curso, deixando vítimas aos milhares.

Mesmo assim, a crista não se curva diante da fúria, força que, chego a pensar, anuncia qualquer coisa que vem por aí, devagar, comendo pelas beiradas. Talvez a natureza comece a responder ao ser humano, que não consegue ouvi-la, tolo que é, sempre ocupado com mesquinharias arquitetadas para derrotar o inimigo que criou e que agora lhe oferece perigo. Para subjugá-lo, inclusive, vende a alma ao diabo, sem qualquer pudor. E mente, e tenta mostrar verdade e justiça nas suas palavras vazias, que ainda servem para enganar meia dúzia.

E o fogo segue destruindo. Às vezes, na forma de magna; noutras, pela secura do mato; em algumas, pelo curto-circuito; em outras, pelas bombas... Aliás, por que reclama do fogo aquele que constantemente faz uso de seu expediente para desgraçar a vida alheia? Talvez tivesse que provar um pouco do seu sabor... Nada se sabe, afinal, dos caprichos daquele que cansou de ver sua irmã terra exaurida e maltratada, sua irmã água desperdiçada e suja, seu irmão ar poluído, tudo por causa de uma gente que, tudo indica, terá como prêmio, por séculos de travessura e maldade contra si e contra o meio, o castigo das labaredas. Não lhe parece justo?




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