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Proposta de Doria ameaça usuários de ônibus da região

Prefeito de S.Paulo estuda limitar entrada de linhas intermunicipais em áreas da Capital

Por Daniel Macário
Do Diário do Grande ABC
03/01/2017 | 07:00
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Denis Maciel/DGABC


Especialistas projetam sérios prejuízos a cerca de 556 mil passageiros de ônibus intermunicipais do Grande ABC caso a proposta de reorganização no sistema de transporte público que tem sido discutida pela equipe do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), se efetive neste ano.

A proposta de reorganização no sistema de transporte público, que tem como um dos principais objetivos dar subsídios à administração da Capital para manter o congelamento da tarifa em R$ 3,80 para os ônibus que circulam no município neste ano, tem sido alvo de críticas por parte de especialistas por envolver mudanças drásticas no atual sistema.

A principal delas envolve uma possível restrição de acesso de linhas intermunicipais, atualmente controladas pela EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) no território da Capital. Segundo a proposta em estudo, usuários do Grande ABC, assim como de toda a Região Metropolitana de São Paulo, que hoje utilizam o serviço, seriam obrigados a descer em terminais localizados no extremo de São Paulo para fazer baldeação automática com uma linha de ônibus municipal da Capital, o que na prática iria gerar receita financeira aos cofres públicos de São Paulo, algo que não existe hoje. O estudo projeta ainda readequação na tarifa para compensar a mudança.

“A princípio o que dá para dizer é que esse estudo não passou por uma aprovação popular, pois ao obrigar o passageiro a fazer essa baldeação, tirando dele esse direito de ir somente como uma única linha, você diminui a qualidade do serviço e, para agravar, deixa menos atrativo”, avalia o professor de Engenharia da FEI (Fundação Educacional Inaciana) Creso Peixoto, especialista em Transportes e Mobilidade Urbana.

A alteração que, se concretizada, irá afetar passageiros de 55 linhas intermunicipais das 112 que circulam em municípios do Grande ABC se assemelha a outra mudança feita no transporte público da região, que foi colocada em prática sem qualquer aprovação por parte de usuários.

No fim de 2011, a CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) diminuiu o trajeto da Linha 10-Turquesa, responsável por atender usuários do Grande ABC. Na época, os trens que saíam de Rio Grande da Serra, passando por Ribeirão Pires, Mauá, Santo André e São Caetano passaram a ter como parada final a Estação Brás. Antes da mudança, as composições realizavam o trajeto até a Luz.

Na ocasião, o governo estadual indicou que a alteração no ponto final foi necessária em virtude do significativo crescimento da demanda de usuários na Estação Luz. No entanto, após série de reclamações por parte de usuários, em especial de passageiros que embarcavam em estações da região, o governo estadual prometeu desfazer a mudança neste ano com a inauguração do Expresso ABC. Porém, um mês após o serviço ter sido inaugurado a proposta ainda não foi colocada em debate.

“Esse fato só reforça que os municípios do Grande ABC, assim como de toda Região Metropolitana, devem iniciar de maneira urgente a discussão da integração tarifária em suas respectivas áreas. Não podem ficar dependentes do Estado”, relata Peixoto.

Na análise do professor Luiz Vicente Figueira de Mello, especialista em Mobilidade Urbana e coordenador do curso de Engenharia do Mackenzie Campinas, mais do que pensar no sistema de integração de ônibus entre municípios é necessário também colocar em pauta o suporte da iniciativa privada. “Essa discussão não deve ficar presa somente ao Estado. Municípios precisam expandir esses projetos e pensar no apoio de instituições privadas. O atual modelo precisa ser revisto.”

Embora tenha adiado por diversas vezes a discussão da integração do transporte de ônibus municipal da região e, por consequência, ter uma parcela de culpa na fragilidade do atual sistema oferecido, o Consórcio Intermunicipal Grande ABC fez duras críticas à proposta apresentada por João Doria. “(A entidade) Contesta a proposta cogitada pelo prefeito de São Paulo, visando vetar a entrada de ônibus intermunicipais na Capital. Tal medida, se adotada, estará em direção oposta ao debate construído na região, que resultou no Plano Regional de Mobilidade e, mais recentemente, às propostas formalizadas pelo Consórcio, juntamente com as prefeituras de São Paulo e Guarulhos, como contribuições do Plano Diretor Metropolitano.”

Segundo a entidade, “o único resultado dessa suposta ‘reorganização’ no curto prazo será o prejuízo aos usuários” do Grande ABC, “ao mesmo tempo em que não será resolvido o problema de integração física, operacional, modal e tarifária da região”.

Em nota, a EMTU informou que “desconhece qualquer estudo para reorganizar o sistema de arrecadação do transporte intermunicipal por ônibus na Capital, assim como nos demais 38 municípios da Região Metropolitana de São Paulo”. De acordo com a empresa, a “racionalização do sistema de transporte sobre pneus tem sido objetivo permanente da EMTU.”

Já a assessoria de imprensa do prefeito João Doria ressaltou que “vai reestudar todo o sistema municipal de Transportes e, se for o caso, estabelecer diálogo com o governo do Estado com vista a eventuais readequações do sistema intermunicipal”.

 

Linhas intermunicipais circulam de forma precária

 

“Tudo que é ruim pode piorar”. Foi com essa frase que a doméstica Genimara Ferreira, 43 anos, reagiu à possibilidade da possível restrição de linhas intermunicipais na Capital.

Usuária do sistema, Genimara utiliza os ônibus intermunicipais todos os dias para se locomover entre sua casa, na Capital, até o trabalho no bairro Jardim, em Santo André. “É difícil porque vou ter que pegar outro ônibus lá no Sacomã e provavelmente também posso gastar mais. O complicado é que os ônibus ruins e quebrados ninguém melhora.”

Ao lado da doméstica, a equipe do Diário percorreu o trajeto da usuária na quarta-feira e constatou a precariedade dos coletivos, que constantemente têm problemas de manutenção. Além de bancos soltos, alguns coletivos apresentam inclusive buracos no piso dos veículos. “Teve um dia nesta semana que choveu e uma mulher usou guarda-chuva dentro do ônibus porque chovia mais dentro do que fora”, relata o porteiro José Carlos dos Santos, 64.

Para usuários, o sistema, ao invés de melhorar com o passar dos anos, tem agravado sua situação precária. “Uso esses ônibus há 16 anos e só vejo veículos cada vez mais ruins”, relata a doméstica Ruth Pereira, 51.

Neste ano, os problemas das linhas intermunicipais se estenderam ao administrativo das permissionárias que controlam os coletivos. Com constantes atrasos de salários, funcionários paralisaram suas atividades ao menos cinco vezes no segundo semestre deste ano, a última semana passada, com coletivos estacionados nas principais vias da região.

Segundo a EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos), responsável pelo serviço, de janeiro a novembro deste ano foram aplicadas 9.979 autuações a controladores das linhas por descumprimento de atividades. Embora o índice seja inferior ao registrado no ano passado, (11.046) representa média de 29 infrações por dia.

 

Publicação de edital de concessão da Área 5 é adiado pela EMTU

 

A EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos) adiou para este ano a publicação do edital referente ao sétimo processo licitatório para concessão de linhas de ônibus intermunicipais da Área 5, responsável por atender passageiros do Grande ABC. A previsão inicial era a de que o documento fosse publicado no mês passado. Segundo a empresa, a nova data ficou para as primeiras semanas deste mês. A alteração não foi justificada.

Atualmente o lote 5 é o único na Região Metropolitana de São Paulo no qual as operações não são regularizadas por meio de concessões. Dessa forma, as 17 permissionárias que prestam serviços no Grande ABC atuam com contratos feitos por linhas e itinerários, e não por área, o que na prática dificulta a fiscalização do serviço, bastante criticado pela população da região.

Conforme a proposta apresentada pela EMTU, a previsão é que a empresa ou consórcio que assuma a Área 5 tenha uma concessão de 15 anos no serviço. A mudança visa atrair empresários para o certame.

 




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